próxima início prévia
Próxima: 19. Serrasalmo (sensu strictu) Início: E. O grupo dos Prévia: E. O grupo dos

18. Serrasalmo (Pygocentrus) piraya Cuv.

1648.
Piraya et Piranha: Marcgraf de Liebstad, Historiæ rerum naturalium Brasiliæ lib. IVtus, pp. 164 & 165.
1819.
Serrasalmo piraya: Cuvier, Sur quelques espèces de poissons, Mémoires du Museum, tomo V, p. 368, prancha 28, fig. 4 (``Il a été envoyé du Brésil par M.A. de St. Hilaire''. loc. cit., p. 369.)
1829.
Serrasalmo piranha Civ.: Spix & Agassiz, Selecta genera et species piscium, p. 71, tomo 28. (``Habitat in flumine Sti. Francisci, inque vicinis lacubus, piscinis, rivulis''.)
1849.
Pygocentrus piraya Müll.: (Cuvier et) Valenciennes, Histoire naturelle des poissons, tomo XXII, p. 291158.
1859.
Pygocentrus piraya M. Tr.: R. Kner, Beiträge zur Familie der Characinen, II Abtheilg. p. 28. (Denkschr. d. mathem. naturw. Classe d. Akademie d. Wiss. Wien, Vol. XVIII, p. 36.)

Já que tanto Serrasalmo piraya ou piranha de Cuvier e Spix-Agassiz são do Rio São Francisco, não pode haver qualquer dúvida de que esta espécie impressionante do ``Rio das Velhas'', que no Brasil se chama ``piranha-rodoleira'' ou a piranha de costas redondas, da qual o Prof. Reinhardt trouxe um exemplar (sem nadadeiras ventrais) de 12 polegadas de comprimento conservado em álcool e 2 peles de 15 polegadas de comprimento, são todas claramente da mesma espécie, apesar da figura de Spix dar uma idéia não muito boa do peixe e a de Cuvier ser ainda pior em vários aspectos, especificamente com relação à aparência em geral e às proporções do corpo. Não será possível deixar de descrever a espécie novamente. Quero ainda salientar que, quando aqui sigo Günther, ao reconhecer Pygocentrus apenas como subgênero de Serrasalmo, é porque tanto eu como Kner comprovamos que neste gênero os dentes não caem com a idade.

\begin{figure}\noindent{\epsfxsize =\hsize\epsfbox{PEIXE14.PS}}\end{figure}

A forma do corpo é, aproximadamente, uma elipse regular; o perfil dorsal forma uma curvatura bastante forte e regular da nadadeira dorsal até a testa, que desce quase verticalmente, praticamente sem qualquer depressão acima do olho; também o perfil ventral forma uma curvatura regular do lábio inferior até a nadadeira anal, de modo que o ponto mais baixo do arco se situa à frente das nadadeiras ventrais; a maxila inferior ultrapassa um pouco, mas não muito, a parte de cima da boca. A distância da ponta do focinho até o início da nadadeira dorsal é maior que a distância deste ponto até o início da nadadeira caudal, mas menor que a distância da ponta do focinho até a nadadeira anal, e o início da nadadeira dorsal está um pouco mais perto da nuca que da nadadeira caudal. A altura é maior que a metade do comprimento total até a raiz da nadadeira caudal, mas igual à metade, quando calculado até a ponta da nadadeira caudal. O comprimento da cabeça (da ponta do focinho até a abertura branquial) é contido mais que uma vez e meia na altura do corpo e 3 vezes no comprimento total (até a raiz da nadadeira caudal) e sua largura mais de uma vez e meia no seu comprimento; o olho, pequeno e situado bem baixo, está igualmente distante do perfil dorsal e do ventral, mas muito mais próximo da ponta do grosso e largo focinho que do pré-opérculo; seu diâmetro é um sexto do comprimento da cabeça e é contido 2 2/3 vezes na largura da testa (medida em linha reta) entre os olhos, a qual por sua vez é contida 2 1/4 vezes no comprimento da cabeça. As narinas ficam na altura ou mesmo um pouco acima da borda superior dos olhos. Os ossos da cabeça que possuem escultura (listrados ou cinzelados), são os suborbitais, o pré-opérculo e os 3 operculares juntamente com um pequeno supra-orbital e supratemporal de cada lado; o segundo suborbital é aproximadamente da mesma altura e comprimento e alcança completamente o pré-opérculo, cuja parte anterior, horizontal, é visível. O opérculo é 4 vezes mais alto que largo. O número de dentes é, como o usual, ${{6}\over{7}}$; os do meio (mais anteriores) são os mais longos (mais altos), os do lado os mais baixos e mais largos, e os da maxila inferior sempre significativamente maiores que os da superior (intermaxilar); suas cúspides laterais são menos salientes que no menor dos S. Brandtii; o primeiro e o terceiro dentes da parte superior da boca (intermaxilar), assim como nesta outra espécie são um pouco menores que o segundo. O comprimento da nadadeira dorsal (ao longo de sua base) é menor que o da nadadeira anal, que é aproximadamente igual à metade da altura do corpo; a nadadeira caudal é nitidamente entalhada e tem as pontas arredondadas pelo desgaste. A nadadeira adiposa é pequena; situa-se aproximadamente a meio caminho entre a nadadeira caudal e a nadadeira dorsal e é mais ou menos coberta de escamas até a metade; seu comprimento (ao longo de sua base) é de metade a um terço de sua distância até as nadadeiras mais próximas; no exemplar menor ela tem somente um raio, mas em ambos os maiores é completamente ocupada por 7 raios (parece ser possível dar o número preciso dessas estruturas desenvolvidas irregularmente), que ficam bem próximos uns dos outros e são bifurcados e segmentados159. A altura da nadadeira dorsal na frente, onde ela é mais alta, é nove treze-avos de seu comprimento, não sendo muito mais baixa na parte de trás (mas não mais alta atrás, como Cuvier a descreve); também não há diferença maior na nadadeira anal entre a parte anterior e a posterior, além do fato de o comprimento dos raios posteriores ser aproximadamente a metade dos da frente. As pontas das nadadeiras peitorais caem acima da raiz das nadadeiras ventrais, ao passo que as destas últimas alcançam somente até a metade da distância que separa as nadadeiras ventrais da anal. Existe, em geral, uma faixa nua no meio do dorso, acima da nuca, até a nadadeira dorsal, e a cobertura de escamas sobre a nadadeira anal alcança até a metade da altura do raio, na sua parte posterior e até um terço da altura, na sua parte anterior. O número de escamas ao longo da linha lateral não muito nítida, que não pode ser dado com precisão devido ao seu arranjo pouco regular, é de aproximadamente 100 ou um pouco mais. O número de espinhos ventrais160- até o ânus - é 25-26; à frente da nadadeira anal existe um espinho ou nódulo ósseo duplo, mas aqui não se encontram espinhos nos lados do ânus como nos verdadeiros Serrassalmonina. O número de raios é: D.: 18-20 (2 + 16-18); P.: 14-17; V.: 6-7; A.: 31-32 (2-3 + 28-29); C.: 6-7 + 18-20 + 6-7.

Reinhardt descreve a cor do peixe vivo do seguinte modo: ``no dorso e na superfície da cabeça (a nuca e a testa) era bronze bastante escuro com reflexos dourados (que, entretanto, não eram nítidos na cabeça); para baixo, nos lados da cabeça e do corpo, a cor se tornava mais clara e o reflexo dourado mais perceptível; finalmente, em direção ao ventre era quase branco-prateado com muito pouco reflexo dourado, ao passo que, precisamente na fina quilha do ventre, se mostravam traços de um tom vermelho-carmim, que também apareciam nos lados da maxila inferior. As nadadeiras eram de cor bronze como a superfície da cabeça, somente as nadadeiras ventrais eram mais claras, com tons avermelhados. A íris era dourado-esbranquiçada; a pupila, alongada na direção vertical, era circundada acima e abaixo por uma mancha alongada, perpendicular e perto dela um anel muito estreito de puro dourado''. - Em uma ``piranha'' cujo conteúdo do ventre foi examinado, encontrou-se somente um espesso muco verde, algumas escamas de peixes e algumas bolas ovais, com cerca de 2/3 polegadas de tamanho, de pêlos de mamíferos entrelaçados (de rato ou outro pequeno animal semelhante). Reinhardt só teve motivos para considerar os relatos sobre o medo das piranhas como não pouco exagerados, apesar de ele, de modo algum, negar que esses peixes, sob certas circunstâncias, possam se tornar perigosos para animais e pessoas.

Certamente, é muito provável que esta seja uma espécie próxima da que foi descrita por Marcgraf; o fato de a ilustração - se ela realmente representa esta espécie e não o ``Pirayæ alias species'' dele - mostrar o peixe demasiadamente alongado não pode entrar em consideração, pois a descrição refere-se expressamente à altura como sendo a metade do comprimento, o que comprovamos ser completamente correto quando a nadadeira caudal é incluída no comprimento total. Pelo que foi esclarecido acima, não restam muitas dúvidas de que Cuvier teve precisamente esta espécie em suas mãos, ainda que se possa objetar tanto contra a descrição e a ilustração como contra suas afirmações de que ela seja relativamente menos alta que Serrasalmo rhombeus (já que o caso é justamente o contrário), que o ponto mais alto do corpo seja logo acima da abertura das guelras, e que a altura (6 1/2 polegadas) seja muito menor que a metade do comprimento total (17 polegadas), isto é, que a forma do corpo seja relativamente muito alongada; aqui é preciso considerar que Cuvier teve somente um exemplar empalhado em suas mãos, o qual, no processo de preparação, ficou completamente deformado. A descrição da nadadeira dorsal como sendo mais alta na parte de trás talvez seja uma imprecisão, que também se deve ao estado de preservação do peixe, e o fato de Cuvier (assim como Kner mais tarde) ter considerado o espinho horizontal à frente da nadadeira dorsal como sendo apenas um ``simple tubercule mousse'' (NT: um simples tubérculo rombudo(?)) parcialmente enfiado na carne também não é muito importante, pois, quando ele é exposto, revela a forma usual de espinho. Valenciennes não faz qualquer menção se estas conjecturas faltam na descrição de Cuvier, mas como sua descrição na realidade somente leva em consideração as diferenças entre esta e Pygocentrus niger, ela não é muito informativa para aquele que não tem a oportunidade de fazer tal comparação. É bastante duvidoso que Castelnau tenha obtido a espécie de ``piraya'' que vive no São Francisco e seus afluentes, em Goiás, Araguaia e Rio Amazonas; em sua ilustração (prancha 38, fig. 2) a relação entre comprimento e altura é bem correta, mas não o aspecto da cabeça; a forte depressão acima do olho é desconhecida nesta espécie. A ilustração de Spix, que foi feita de um exemplar empalhado de 15 polegadas de comprimento, mostra um peixe alongado em demasia, mas expressa bem suas características em vários pontos, e na descrição de Agassiz não encontro nada que fale contra a identificação; a contagem dos raios da nadadeira dorsal ter sido dada como 4 + 15 naturalmente se deve a um erro de escrita ou um engano; declara-se, além disso, que o exemplar veio do Rio São Francisco. Os exemplares de Kner, de mesmo tamanho, foram trazidos por Natterer, mas infelizmente sem menção à localidade; o fato de ele não ter contado todos os pequenos raios de suporte da nadadeira caudal é de menos importância. Como o diagnóstico de Günther também se ajusta a S. piraya que ocorre no Rio das Velhas, embora seus exemplares sejam de outros lugares (Rio Cupai, Demerara), é mister considerar temporariamente que esta espécie possui uma distribuição mais ampla na América do Sul do que se poderia esperar das espécies de peixe da bacia do São Francisco. Não acredito, entretanto, que ela coincida com Serrasalmo nigricans Spix (loc. cit. prancha 30), que penso ter reconhecido em um exemplar de Pernambuco, que existe no Museu.



próxima início prévia
Próxima: 19. Serrasalmo (sensu strictu) Início: E. O grupo dos Prévia: E. O grupo dos
Luiz Paulo Ribeiro Vaz 2002-06-20