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Prefácio



Roberto Esser dos Reis

Presidente da Sociedade Brasileira de Ictiologia

Museu de Ciências e Tecnologia - PUCRS



O ano era 1847 e o local um reino distante, do outro lado do oceano, onde grandes distâncias, altas serras, florestas densas e doenças tropicais eram tão abundantes quanto as novidades científicas que um explorador poderia encontrar o Brasil. Foi nesse cenário que o zoólogo dinamarquês Johannes Theodor Reinhardt conheceu a região do rio das Velhas, nas Minas Gerais, a convite de outro naturalista, conterrâneo seu, Peter Wilhelm Lund, há alguns anos estabelecido na região. Nos anos seguintes, Reinhardt coletou muitos peixes durante os períodos em que esteve no rio das Velhas, e a grande coleção que formou foi levada para a Dinamarca para ser estudada.

A maior parte do estudo e do trabalho descritivo, entretanto, foi feita por outro zoólogo dinamarquês, Christian Frederik Lütken, que publicou em 1875 sua célebre obra Velhas-Flodens Fiske. O valor singular do trabalho de Lütken decorre de vários fatores, mas especialmente da excelente qualidade de suas ilustrações e detalhamento de suas descrições taxonômicas, acrescidas de inúmeros dados biológicos sobre as espécies, cuidadosamente coligidos por Reinhardt. Além disso, esse trabalho representa o primeiro estudo faunístico baseado em um inventariamento cuidadoso e prolongado feito no Brasil.

Considerando as impensáveis dificuldades pelas quais os exploradores passavam para viajar e coletar peixes na América do Sul do século XIX e comparando o inventário preparado por Reinhardt no rio das Velhas com estudos recentes feitos nesse rio - como nos mostram Carlos Alves e Paulo Pompeu no terceiro capítulo deste volume -, compreendemos o quão dedicados e persistentes foram esses zoólogos pioneiros. Como se pode verificar nesta tradução de Velhas-Flodens Fiske, 55 espécies de peixes foram registradas para o rio das Velhas, juntamente com uma quantidade de dados biológicos incomum para a época.

Hoje, 150 anos de coletas depois, com técnicas avançadas e artes de pesca variadas, Alves e Pompeu assinalaram apenas outras 53 espécies para a bacia do rio das Velhas. O total de 55 espécies coletadas por Reinhardt se reveste de especial significado quando comparado com as 40 espécies então conhecidas de toda a bacia do rio São Francisco, como nos mostra Heraldo Britski na primeira parte deste livro.

Apesar de sua grande importância para o estudo dos peixes do rio das Velhas e do rio São Francisco como um todo, o acesso de ictiólogos brasileiros à obra de Lütken era extremamente limitado em face da linguagem em que foi escrita. Afinal, pouquíssimos de nós - se é que há algum - somos capazes de entender o dinamarquês. A iniciativa da equipe de Carlos Bernardo Mascarenhas Alves e Paulo dos Santos Pompeu de viabilizar a tradução de Velhas-Flodens Fiske para o português é altamente louvável e abre, entre outras possibilidades, oportunidade de realização de estudos comparativos da ictiofauna atual do rio das Velhas com a de 150 anos atrás. Como nos mostram Alves e Pompeu, certas espécies registradas por Reinhardt, quando a região metropolitana de Belo Horizonte não passava de uma vila, não foram identificadas nos levantamentos feitos recentemente ao longo do rio das Velhas, estando mesmo algumas delas ameaçadas de extinção.

Os organizadores deste trabalho propiciaram a todos nós, naturalistas do século 21, uma excelente tradução de Velhas-Flodens Fiske, tornando acessível aos ictiólogos brasileiros o conhecimento gerado há mais de um século por naturalistas pioneiros. Vá em frente, vire a página e deleite-se com a ictiologia e a história deste reino distante!


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Luiz Paulo Ribeiro Vaz 2002-05-21