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4- A fauna atual do rio das Velhas e o estudo de Lütken


O registro da fauna de peixes feito por Reinhardt e Lütken constitui oportunidade única de avaliação das mudanças ocorridas na ictiofauna do rio das Velhas passados mais de cem anos e, principalmente, após a implantação da região metropolitana de Belo Horizonte.

Além da comparação direta com os dados atuais de toda a comunidade de peixes da bacia, os registros históricos foram também comparados separadamente com os dados disponíveis para o rio Cipó e para o alto curso do rio das Velhas. Essas duas regiões da bacia foram intensamente amostradas por Reinhardt e representam, entre os atuais pontos de coleta, os de melhor e pior estado de conservação, respectivamente.

Entre as 55 espécies registradas por Lütken, apenas 13 não foram capturadas. No entanto, quando comparamos os rios Cipó e o alto rio das Velhas separadamente, observamos que, no primeiro, a maioria das espécies relacionadas no trabalho de Lütken foram capturadas, enquanto que no alto Velhas, estas representam uma pequena porcentagem das espécies (Figura 5).

Figura 5: Número de espécies relatcionadas em Lütken (1875) e registradas no presente estudo para o rio Cipó, alto rio das Velhas e para toda a bacia (1999-2000).
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Das 13 espécies relacionadas em Lütken e que não foram capturadas neste estudo, pelo menos sete (Brycon reinhardti, Serrapinnus piaba, Hyphessobrycon gracilis, Pimelodella vittata, Pseudopimelodus zungaro, Parauchenipterus galeatus e Trichomycterus brasiliensis) foram registradas recentemente em outros trabalhos sobre a bacia do rio das Velhas (Alves et al., 1998). Mas deve-se salientar a possibilidade de que algumas tenham desaparecido de certas regiões do rio, principalmente do seu curso superior. A pirapitinga (Brycon reinhardti), por exemplo, é hoje bastante rara em toda a bacia do São Francisco, encontrada apenas em regiões de cabeceira bem preservadas, como o rio Cipó na área do Parque Nacional da Serra do Cipó (Vieira et al., no prelo).

Das 5 espécies citadas por Lütken e que não foram registradas na bacia do rio das Velhas (Conorhynchos conirostris, Franciscodoras marmoratus, Glanidium albescens, Rhamdiopsis microcephalus e Rineloricaria lima), uma merece atenção especial devido a sua importância histórica para a pesca comercial na bacia do São Francisco. Segundo relatos de Reinhardt, o pirá-tamanduá (C. conirostris) subia o rio das Velhas anualmente, de fevereiro a março. É possível que este movimento corresponda à migração reprodutiva para locais de desova localizados nessa sub-bacia. As populações atuais dessa espécie na bacia do São Francisco podem ser inferiores às do passado em virtude da poluição do rio das Velhas (Sato com. pes.).

Em face da longa estada de Reinhardt na cidade de Lagoa Santa, período em que realizou várias coletas, Lütken acreditava que a fauna de peixes da bacia do rio das Velhas fosse quase toda conhecida: ``Não se espera outra importante contribuição posterior sobre a mesma região ...'' ``...que a fauna, com isso, seja totalmente conhecida, ele nunca afirmaria; pelo contrário, ele considera razoável que um ou outro peixe possa ter passado desapercebido; mas ele acredita que as espécies que os investigadores do futuro poderão acrescentar não serão muitas''.

Entretanto, o presente estudo acrescentou outras 53 espécies às 55 relacionadas por Lütken. Tal incremento foi particularmente significativo para o rio Cipó, onde foram registradas 43 dessas espécies. Por outro lado, para o curso superior do rio das Velhas foram adicionadas somente 15 (Figura 5). Cabe salientar ainda que, a partir dos estudos de Lütken, também se observou um aumento expressivo no número de espécies de peixes da bacia do rio São Francisco: àquela época eram conhecidas 65 espécies, hoje conhecem-se 176 só em Minas Gerais (Alves et al., 1998).

O grande número de espécies acrescentadas à lista de Lütken pode ser explicado, em parte, pela diferença de métodos de amostragem. Enquanto boa parte dos exemplares coletados por Reinhardt provinham de pescadores, que raramente capturam exemplares de menor porte, neste estudo foram utilizadas técnicas que permitem a captura de exemplares de todos os tamanhos. Espécies cujos adultos têm menos de 15 cm de comprimento padrão representam cerca de 35% da fauna registrada no presente.

Quando comparamos a distribuição das espécies por classe de tamanho (comprimento padrão máximo), observa-se que de fato a maioria das espécies coletadas exclusivamente neste estudo são de pequeno porte (Figura 6). A carpa (Cyprinus carpio), é a única espécie maior que 50 cm que não foi registrada por Reinhardt. Trata-se de espécie exótica e introduzida posteriormente na bacia

Figura 6: Distribuição das espécies relacionadas em Lüyken (1875) e registradas exclusivamente no presente estudo, por classe de comprimento padrão máximo.
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Entre as 53 espécies registradas exclusivamente neste estudo, merece destaque a captura do cará (Geophagus brasiliensis - Cichlidae) e do tamoatá (Callichthys callichthys - Callichthyidae). A ausência de representantes dessas famílias havia chamado a atenção de Reinhardt e Lütken por serem ``absolutamente dominantes nos rios brasileiros''. É interessante notar que estas espécies, que podem ser consideradas tolerantes à degradação ambiental, são hoje abundantes em grande parte da bacia.




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Luiz Paulo Ribeiro Vaz 2002-06-20