Estrondão no Universo Fantástico


Domingos Soares

19 de dezembro de 2016


Cosmologia moderna, o encadeamento incerto de especulação
a especulação com o objetivo de demonstrar especulação.

Let it Bang, Chronicles of Modern Cosmology — D. Soares

Certamente não devemos menosprezar a evidência dos fatos experimentais
em favor dos sonhos e das vãs imaginações de nosso devaneio pessoal.


Princípios Matemáticos da Filosofia Natural, Livro III — I. Newton, 1687


 

No dia 16 de dezembro de 2016 participei do programa radiofônico Universo Fantástico do Prof. Renato Las Casas. Preparei um artigo sobre o tema de minha participação, o qual pode ser lido clicando em Universo do Estrondão Quente.

Escrevi também um roteiro para as minhas intervenções durante o programa que seguem enumeradas abaixo.

Agradeço ao colega do Departamento de Física da UFMG Prof. Renato Las Casas pelo convite para participar de seu programa semanal.


Notas para participação no programa Universo Fantástico

    1- A cosmologia é a ciência do universo. O seu objetivo final é responder questões cruciais: de onde surgiu o universo, como ele se organiza e para onde ele vai. Os cosmólogos são físicos e astrônomos, que atuam tanto nas esferas teóricas quanto experimentais e observacionais (cf. O Big Bang, um “Estrondão” no espaço e no tempo).
    2- As soluções obtidas por Friedmann resultaram no seguinte modelo de universo: (1) o espaço tridimensional evolui no tempo — expande-se —, a partir de uma “singularidade”, isto é, de um universo de tamanho igual a zero. Obviamente, isto é uma idealização, nada pode ser realmente de tamanho zero! Mas deixemos esta questão de lado, pelo menos por enquanto. Uma determinada quantidade de energia também é criada neste instante inicial. Posteriormente, parte da energia transforma-se em matéria. (2) A maneira como ocorre a expansão depende da quantidade de energia criada no instante inicial. Teremos três possibilidades, as quais recebem os nomes de “universo fechado”, “universo crítico”, ou “plano”, e “universo aberto” (cf. O Big Bang, um “Estrondão” no espaço e no tempo).
    3- Espaço curvo: a superfície bidimensional de uma esfera tridimensional é curva; o espaço tridimensional é curvo, curvo como a superfície tridimensional de uma hiperesfera no hiperespaço — matemático — de quatro dimensões. A geometria deste universo não é euclidiana (cf. O Big Bang, um “Estrondão” no espaço e no tempo).
    4- A utilização do termo Estrondão (ler Universo do Estrondão Quente, UEQ) em lugar de Big Bang tem o objetivo de rigor linguístico (Grande Explosão é a tradução de Great Explosion, por exemplo) e de conquista cultural do conceito científico do termo em inglês. Uma visão desvirtuada pela submissão cultural considera que um termo só tem significado técnico ou validade científica se for expresso em idioma estrangeiro, o idioma do formulador dominante das atividades científicas.
    5- O UEQ é o resultado de hipóteses e leis físicas aplicadas a um universo ideal que é um fluido ideal (i.e., isotrópico e homogêneo) tipo poeira. Tecnicamente uma poeira é um fluido de matéria que exerce pressão nula, ou seja, não possui movimentos aleatórios. Estas aproximações são bastante fortes e não é de se espantar ver as inconsistências que o UEQ apresenta (ler mais detalhes em Os primeiros passos na cosmologia relativista). O resultado é um universo que teve um início num evento de criação, o Estrondão, 14 bilhões de anos atrás, o que é apenas 3 vezes a idade da Terra. O universo está em expansão e a cerca de 4 bilhões de anos a expansão passou a se acelerar. O cosmólogo Fred Hoyle e seus amigos acham que trata-se de um quadro bastante forçado, criado por alguns cosmólogos influentes e líderes, que eles denominam gansos, quadro este que é aceito de forma conformista pelos seus seguidores (cf. COSMOS:02dez16).
    6- Existem outras teorias cosmológicas que não possuem um evento inicial. Nelas, o universo é infinito, espacialmente, e eterno, temporalmente. É claro que a questão do início ainda existe, mas nestas teorias ela é, de certa forma, ignorada. Isto não nos satisfaz, certamente, e nem aos cosmólogos. Tanto nos modelos com eventos iniciais quanto nos modelos infinitos, a questão permanece: como tudo começou? (cf. O Big Bang, um “Estrondão” no espaço e no tempo).
    7- A Teoria do Estado Quase Estacionário de Hoyle, Burbidge e Narlikar assim como a antiga Teoria do Estado Estacionário preveem uma expansão acelerada (cf. Cosmologia moderna: tateando no escuro).
    8- A matéria bariônica observada hoje tem que ser consistente com a matéria bariônica da nucleossíntese primordial, o que resulta em 5% do total do UEQ. Mas só 0,5%, ou seja, 10 vezes menos, são observados. Este é o primeiro problema de matéria escura. Agora, aparece um segundo problema de matéria escura, porque existe a necessidade de matéria adicional para suportar a dinâmica de galáxias em grande escala no universo, quase 30% do total. Ela não pode ser bariônica pois o UEQ só admite 5% de bárions, então ela tem que ser exótica, i.e, não bariônica. Até hoje não se sabe que matéria seria esta (cf. Cosmologia moderna: tateando no escuro).
    9- A constante cosmológica é a forma mais simples de “energia escura” e é uma energia associada ao vácuo quântico. Existe também a possibilidade teórica de a energia escura possuir uma variação temporal.
    10- A nova componente escura responsável pela aceleração da expansão deve ser uma componente de energia e não mais um termo de matéria escura por vários motivos, entre eles, (1) a matéria desacelera a expansão e quer-se aceleração, (2) a matéria exerce pressão quase nula (idealmente, na ausência de movimentos aleatórios, como no UEQ, a pressão é exatamente nula) e a nova componente escura deve exercer pressão, uma característica intrínseca de uma componente de energia. A pressão desta nova componente energética, chamada “energia escura”, deve ser negativa, pois assim, de acordo com a Teoria da Relatividade Geral, o seu efeito sobre a matéria é repulsivo e fornece o mecanismo para a aceleração da expansão do universo (cf. Cosmologia moderna: tateando no escuro e Introdução à Cosmologia, Ronaldo E. de Souza, p. 273, EDUSP, 2004).
    11- Sobre a possibilidade da distribuição de matéria escura não bariônica ser mais uniforme do que se pensa (Boletim do ESO, 07 de dezembro): o Modelo Padrão da Cosmologia (MPC), o Universo do Estrondão Quente, precisa de uma distribuição discreta (grumosa, como a casca da atemoia) de matéria escura não bariônica para fornecer os sítios de colapso gravitacional primordial da matéria bariônica e dar assim origem às primeiras estruturas bariônicas (estrelas, galáxias, atemoias e nós...). Sem este esqueleto então nós não estaríamos aqui. São resultados iniciais ainda, mas colocam (como diz João Costa, cadastrado em COSMOS, direto de Almada, Portugal) “mais um buraco no queijo suíço do MPC; não demora termos a completa falta de queijo…” Vamos aguardar o desenrolar dos acontecimentos.



Universo Fantástico, 16 de dezembro de 2016

Fotografia de cima, a partir da esquerda, Aline (graduanda em Física), atenciosa dos e-mails, Patrícia (graduanda em Matemática), suplente em treinamento, Prof. Renato Las Casas (coordenador do Grupo de Astronomia), criador de Universo Fantástico, Prof. Domingos Soares (astrofísico), convidado, Cristina (graduanda em Física), atenciosa do telefone e Bárbara (graduanda em Física), a curiosa. Fotografia de baixo, sai Bárbara entra Lucas Henrique (mestrando em Astrofísica), colaborador de Universo Fantástico (todos são da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG).




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