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Difração de Elétrons de Baixa Energia (LEED)

Entre as técnicas capazes de fornecer informações estruturais a Difração de Elétrons de Baixa Energia [15,16,17,18,19,20,21,22] ocupa um lugar de destaque. Esta técnica vem sendo usada há mais de 20 anos e é a responsável pela determinação da estrutura de um grande número de superfícies, como pode ser verificado na figura 3.

Figure 3: Número de estruturas consideradas totalmente determinadas por técnicas até 2000 [2].
\begin{figure}\centering\epsfig{file=figuras/tecnicas1.eps, width=12cm}\end{figure}

Numa experiência LEED, um feixe monoenergético de elétrons

Figure 4: Representação esquemática de uma experiência de Difração de Elétrons de Baixa Energia (LEED).
\begin{figure}\centering\epsfig{file=figuras/leed1.eps, width=12cm}\end{figure}

(E, $ \vec{k^{'}}$) é dirigido sobre a superfície de um monocristal (figura 4). Os elétrons são então retro-espalhados pela superfície dando origem a um conjunto de feixes difratados (E, $ \vec{k^{''}}$) com a mesma energia do feixe incidente. A distribuição espacial destes feixes espalhados e, em especial, como suas intensidades variam com a energia do feixe incidente e com o ângulo de incidência, possuem informações sobre o arranjo estrutural dos átomos na superfície. Uma vez que a determinação do ângulo de incidência é uma tarefa complexa, na maioria dos trabalhos de determinação estrutural os dados experimentais consistem de um conjunto de curvas onde, para cada feixe difratado, as intensidades são medidas em função da energia do feixe incidente, mantendo-se o ângulo de incidência fixo. Estas curvas são conhecidas como curvas I(V). Entretanto, devido ao fato dos elétrons estarem sujeitos a processos de espalhamento múltiplo, estas curvas I(V) não podem ser diretamente invertidas, como no caso do raios X, fornecendo a estrutura atômica que as geraram. Isto faz com que a análise via LEED seja realizada através da comparação entre teoria e experiência. Portanto cálculos baseados em modelos estruturais devem ser realizados para gerar as curvas I(V) teóricas.

A intensidade de um determinado feixe difratado I $ _{\vec{k^{''}}}$(V) pode ser expressa, em uma forma bem geral, como:

$\displaystyle I_{\vec{k^{''}}}(V)= \left\vert\psi_{i}(E,\vec{k^{''}};\vec{r_{1}...
...{n}}) \psi_{s}(E,\vec{k^{''}};\vec{r_{1}},...,\vec{r_{n}})\right\vert^2 e^{-2M}$ (1)

onde $ \psi_{i}(E,\vec{k^{''}};\vec{r_{1}},...,\vec{r_{n}})$ é a função de onda dos elétrons pertencentes ao feixe incidente que foram refletidos pela superfície do cristal sofrendo apenas um único espalhamento, $ \psi_{s}(E,\vec{k^{''}};\vec{r_{1}},...,\vec{r_{n}})$ é a função de onda dos elétrons que sofreram mais do que um espalhamento antes de deixarem o cristal (espalhamento múltiplo), $ T_{\vec{k^{''}},\vec{k^{'}}}(E;\vec{r_{1}},...,\vec{r_{n}})$ é a matriz de espalhamento, $ M$ é o fator de Debye-Waller e $ (\vec{r_{1}},...,\vec{r_{n}})$ representa as posições dos átomos na superfície do cristal. Pode-se notar que as intensidades difratadas dependem tanto das posições dos átomos na superfície quanto de suas vibrações térmicas. Portanto, através da comparação entre as curvas I(V) geradas teoricamente com as obtidas experimentalmente podemos obter informações quantitativas das posições dos átomos na superfície e da maneira com estes átomos estão vibrando. Entre os programas existentes para o cálculo teórico das curvas I(V) vale a pena ressaltar o ``Automated Tensor Leed Program'' [20,23,24,25] desenvolvido pelo grupo do Prof. M.A. Van Hove da Universidade de Berkeley, o ``LEEDFIT'' [26,27,28,29,30] desenvolvido pelo grupo do Prof. W. Moritz da Universidade de Munique e o programa baseado no método de busca global conhecido como ``Fast Simulated Annealing'' [31,32], desenvolvido pelo grupo de física de superfícies da UFMG. Recentemente, iniciamos na UFMG a implementação do método de busca global conhecido como Algoritmo Genético [33] ao problema da determinação estrutural via LEED em colaboração com o grupo do Prof. Michel A. Van Hove do Lawrence Berkeley National Laboratory [34].

Do ponto de vista experimental, a qualidade e a quantidade dos dados disponíveis para tal análise são importantes fatores a serem observados, pois diferentes feixes podem apresentar diferentes sensibilidades com relação à mudanças nos parâmetros estruturais. Do ponto de vista teórico, o ponto principal a ser considerado é a precisão e o grau de convergência dos métodos perturbativos utilizados no tratamento do processo de espalhamento múltiplo. Além disso, pelo menos o parâmetro estrutural tido como o ``mais importante'' deve ser variado de forma a assumir um número significativo de arranjos estruturais distintos. Vê-se então que uma grande quantidade de dados deve ser comparada e um método sistemático, objetivo e quantitativo de comparação se torna essencial para uma análise estrutural via LEED. Entretanto, a decisão sobre ``o que'' e ``como'' se comparar as curvas I(V) experimentais e teóricas e a compreensão dos resultados é uma questão delicada. Ultimamente vem-se utilizando um algoritmo de comparação que nos fornece um fator implementado de tal maneira que na comparação entre duas curvas idênticas o resultado é nulo e, à medida que as curvas vão se diferenciando, este fator vai aumentando. Este algoritmo é conhecido por fator-R (``Reliability Factor'') e foi trazido da difração de raios X para o LEED.

Figure 5: Estrutura obtida via LEED para a Ag(111) $ (\sqrt {3}\times \sqrt {3})$R30$ ^{\circ }$-Sb. Os parâmetros estruturais são apresentados na tabela 2.
\begin{figure}\centering\epsfig{file=figuras/root3a.eps, width= 9cm}\epsfig{file=figuras/root3b.eps, width=12cm}\end{figure}

Existem em LEED várias definições de fatores-R, sendo alguns mais sensíveis às posições dos picos presentes nas curvas I(V) e outros mais sensíveis às alturas dos picos. Atualmente o fator-R mais utilizado em LEED é o proposto por Pendry (R$ _{P}$), mais sensível às posições dos picos de difração presentes nas curvas I(V) [16].

No intuito de ilustrarmos o tipo de informação que se obtém através de uma análise LEED, apresentamos na figura 5 e nas tabelas 1 e 2 os resultados de um estudo estrutural de uma das fases ordenadas - $ (\sqrt {3}\times \sqrt {3})$R30$ ^{\circ }$ - que surge após a deposição de Sb (0.33 monocamada) sobre Ag(111) [35]. Neste trabalho, os seis modelos possíveis para a superfície foram analisados (4 modelos com os átomos de Sb ocupando sítios de adsorção sobre o substrato de prata - ``top'', ``bridge'', ``hcp'' e ``fcc'' - e 2 modelos com os átomos de Sb ocupando sítios substitucionais formando uma liga Ag-Sb). Os resultados deste estudo claramente indicam que os átomos de Sb não apenas ocupam sítios substitucionais formando uma liga na superfície, mas que toda a primeira camada é deslocada para sítios ``hcp'' provocando uma quebra no empilhamento em relação ao substrato. Os resultados obtidos via LEED estão de acordo com os obtidos utilizando a técnica de Difração de raios-x em superfícies (SXRD) [36]. A mesma quebra de empilhamento relativo ao substrato foi observado


Table 1: Valores do fator R$ _{P}$ para os vários modelos analisados para Ag(111)($ \sqrt {3}$x$ \sqrt {3}$)R30$ ^{\circ }$-Sb antes e após a otimização das distâncias interplanares d$ _{12}$, d$ _{23}$ e d$ _{34}$. As distâncias interplanares correspondem ao valor após o refinamento.
Modelos Estruturais R$ _{P}$ inicial R$ _{P}$ final d$ _{12}$(Å) d$ _{23}$(Å) d$ _{34}$(Å)
liga hcp 0.66 0.45 2.502 2.347 2.443
liga fcc 0.70 0.65 2.408 2.309 2.383
overlayer hcp 0.76 0.58 2.455 2.344 2.347
overlayer fcc 0.67 0.66 2.376 2.400 2.336
overlayer top 0.69 0.59 2.454 2.415 2.365
overlayer bridge 0.81 0.78 2.359 2.359 2.359



Table 2: Parâmetros estruturais para o modelo substitucional ``hcp'' obtidos por LEED [35] e por SXRD [36]. Os deslocamentos estão definidos conforme ilustrado na figura 5. $ ^{*}$ significa que o parâmetro não foi investigado no estudo de SXRD e sim mantido fixo em seu valor de volume.
LEED [35] SXRD [36]
$ \Delta_{\perp}^{1}$ (Å) $ 0.07\pm0.04 $ 0.03
$ \Delta_{\perp}^{3}$ (Å) $ 0.05\pm0.05 $ 0.00$ ^{*}$
d$ _{12}$ (Å) $ 2.46\pm0.03 $ 2.50
d$ _{23}$ (Å) $ 2.34\pm0.04 $ 2.36
d$ _{34}$ (Å) $ 2.42\pm0.07 $ 2.36$ ^{*}$
$ \Delta_{\parallel}$ (Å) $ 0.00\pm0.07 $ 0.06

em um sistema semelhante, Cu(111) $ (\sqrt {3}\times \sqrt {3})$R30$ ^{\circ }$-Sb, utilizando-se espalhamento de íons de média energia (MEIS) [37]. Pode-se observar pelos erros apresentados na tabela 2 que a precisão nos parâmetros estruturais obtidos em uma análise LEED é da ordem de centésimos de Angstrons. Vemos então que o LEED é uma técnica capaz de fornecer informações estruturais sobre as camadas atômicas abaixo da superfície, além de fornecer resultados com um alto grau de precisão.


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2003-01-02