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Nos últimos anos tem-se notado uma intensa atividade na área de
heteroexpitaxia e homoepitaxia de metais e semicontudores utilizando-se o
crescimento camada-por-camada mediante a presença de surfactantes,
usualmente denominada ``Surfactant Mediated Epitaxy'' (SME). A definição
clássica de surfactante é: `` uma substância que reduz a tensão
superficial aumentando as propriedades de ``spreading'' e ``wetting''. Do
ponto de vista da epitaxia, surfactante é toda substância ou mesmo
impurezas que uma vez presente na frente de crescimento, é capaz de modificar
o crescimento. Em alguns casos, a presença dos surfactantes é capaz de
modificar o modo de crescimento de tridimensional (ilhas) para bidimensional
(camada por camada).
Por exemplo, tem se observado que a pré-adsorção de monocamadas de
elementos tais como Sb, As e Te, muda o crescimento de Ge sobre Si(100) de um
crescimento tipo Stranski-Krastanov (inicialmente camada-por-camada, depois em
ilhas) para tipo Frank-Van der Merwe (camada-por-camada) (Copel et al.,
1989). O mesmo comportamento foi verificando quando se crese InAs sobre
a superfície (100) de GaAs previamente coberta com Te (Rodrigues
et al, 1995; Miwa et al., 1998). Demonstrou-se também que a
deposição de Sb sobre Ag(111) (van der Vegt et al., 1992) ou a
adsorção de Oxigênio sobre Pt(111) (Esch et al., 1994) pode
induzir o crescimento homoepitaxial camada-por-camada em condições
típicas onde o crescimento em ilhas, para sistemas puros, deveria ocorrer.
Além disso observou-se também que a utilização da SME no crescimento
camada-por-camada de filmes reduziu, em várias monocamadas, a região de
transição que surge no início em crescimentos heteroepitaxiais. O
surgimento desta regiao se dá devido à diferença existente entre os
parâmetros de rede dos compostos envolvidos no crescimento. Desta maneira,
obtem-se uma interface mais abrupta entre os dois materias.
Modelos teóricos de crescimento epitaxial sugerem que o modo de
crescimento é determinado pela energia livre de superfície do
substrato (),
a energia livre da interface
() e da energia livre
de superfície da camada heteroepitaxial
(). A desigualdade
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define o tipo de crescimento. Se esta desigualdade for satisfeita, o
crescimento é do tipo Frank-Van der Merwe. Caso a desigualdade tenha sinal
contrário, normalmente o crescimento é do tipo Volmer-Weber
(crescimento em ilhas).
Imaginemos que se queira crescer um determinado filme composto de camadas de
átomos tipo A intercaladas com átomos tipo B. Normalmente, uma das
duas espécies atômicas possui uma energia livre de superfície
menor. Consequentemente, se A pode crescer sobre B no regime de Frank-Van der
Merwe ou no de Stranski-Krastanov, então B crescerá sobre A no
regime de Volmer-Weber. Esse fato representa um sério obstáculo no
crescimento de hetero-estruturas. Ao adicionarmos um surfactante S, a energia
livre de superfície tanto de A quanto de B é reduzida, provocando uma
considerável mudança no modo de crescimento.
Figura 2.5:
Esquema de como ocorre a ``troca de lugar'' entre o átomo A e o
surfactante S . (a) Antes da troca; (b) estágio intermediário;
(c) após a troca.
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Um modelo para o crescimento homoepitaxial de metais mediante a presença
de surfactantes foi proposto por Zhang e Lagally (1994).
Segundo este modelo, se os potenciais de atração efetivos entre os
átomos do metal A e do surfactante S obedecerem a seguinte desigualdade
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(2) |
então, uma sub-camada de átomos S age como um bom surfactante no
crescimento de A sobre A. Com base nesse modelo, a dinâmica de
crescimento se daria da seguinte maneira: inicialmente vamos examinar como
seria a morfologia do substrato antes da deposição do metal A, mas
com uma pequena cobertura do surfactante S (abaixo de 1 monocamada). Se
VS-S é muito pequeno (no
sentido que
,
os átomos S não se agregam. Sendo assim, não há
formação de ilhas tipo S. Comecemos então a deposição
de A sobre a superfície. Vamos considerar que a deposição
ocorrerá a uma dada temperatura do substrato de tal maneira que, para o
sistema puro, o crescimento seria tri-dimensional. Sendo assim, tanto
VA-A quanto
VA-S são grandes comparados com kT.
Assim que um átomo A atinge a superfície e encontra um átomo S,
ocorre a formação de um ``A-S dimer''. Esse ``dimer''
funcionará como um centro de nucleação efetivo para átomos
tipo S, que se aproximam do ``dimer'' pelo lado do átomo A, ou para
átomos tipo A. Desta maneira, o número de ilhas nos estágios
iniciais do crescimento é proporcional ao número de
átomos A depositados. É claro que não se desejam camadas
compostas por uma mistura A-S ao final do crescimento. Então torna-se
vital que os átomos do surfactante ``flutuem'' sobre a frente de
crescimento. Tal comportamento só será possível caso a
desigualdade
VA-A > VA-S
seja satisfeita. Devido ao fato de
VA-A > VA-S,
sempre que um átomo S estiver prestes a ser ``soterrado'' em uma camada
por um átomo de A na camada superior, a incorporação do
átomo A na camada inferior através da ``troca de lugar''
com S se faz altamente provável (Fig. 2.5).
Se o átomo S estiver localizado na borda de um degrau, um mecanismo
diferente do descrito acima deve ocorrer (Fig. 2.6). Um átomo A que
atinge a borda do degrau contendo um átomo S, ``rola'' degrau abaixo
empurrando o átomo S.
Figura 2.6:
Esquema mostrando como um átomo surfactante localizado num degrau
influencia a dinâmica de crescimento.
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Resultados de simulações (Zhang e Lagally, 1994), mostraram que o
processo de troca ilustrado na Figura 2.5 e o fato dos átomos de
surfactantes agirem como centros de nucleação são os principais
responsáveis pela eficiência do processo de crescimento mediante a
presença de surfactantes. Modelos onde este processo de
``troca de lugar'' (Fig 2.5) não foi considerado
apresentaram superfícies com alto grau de rugosidade ao final do
crescimento. Os resultados provenientes destas simulações estão
em total acordo com estudos experimentais dos sistemas Pt/O/Pt(111) e
Cu/In/Cu(100) (Jiang et al., 1998).
Entretando, resultados recentes de STM (Vrijmoeth et al., 1994;
van der Vegt et al., 1998) mostraram que para o sistema
Ag/Sb/Ag(111) este modelo não é capaz de explicar crescimento
dendrítico observado. Um novo modelo baseado no fato de que os
átomos de surfactantes
agiriam como centro repulsores foi então proposto por Scheffler e
colaboradores (1996). Embora este modelo seja capaz de explicar o crescimento
dendrítico observado no sistema Ag/Sb/Ag(111), ele não descreve
corretamente a dinâmica de cresci-mento verificada para o Pt/O/Pt(111) ou
Cu/O/Ru(0001). Atualmente o que se acredita é que diferentes surfactantes
seguem diferentes modelos, ou combinações deles. Desta maneria um
único modelo não seria capaz de descrever, de maneria
satisfatória, como a presença de elementos surfactantes altera a
dinâmica de crescimento.
Edmar Avellar Soares
1998-12-24
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