Telescópio Espacial Webb, o sucessor do Hubble

Domingos Soares

09 de março de 2011

O Telescópio Espacial Hubble (HST, de Hubble Space Telescope) é um grande sucesso da astronomia observacional. Trata-se do primeiro telescópio óptico orbital e deverá continuar em operação, pelo menos, até 2013. As extraordinárias realizações científicas e os detalhes do telescópio podem ser apreciados no relato, de minha autoria, intitulado “O Telescópio Espacial Hubble”.

A grande questão é então: “E depois do Hubble, o que virá?”. E por incrível que pareça esta foi a pergunta que ocorreu aos realizadores do Hubble apenas 4 anos após o lançamento do telescópio, o qual ocorreu em 24 de abril de 1990. O Hubble já era um estrondoso sucesso e todos se preparavam para o próximo passo.

Sob a liderança da agência espacial norte-americana NASA, 15 países se uniram para o desenvolvimento de um telescópio espacial, para a observação de várias faixas de infravermelho, e que recebeu o sugestivo nome de “Next Generation Space Telescope”. Logo em seguida o seu nome foi mudado para “James Webb Space Telescope”, em homenagem a James Edwin Webb (1906-1992), administrador da NASA, durante vários anos, especialmente na era das missões Apolo, que colocaram o homem na Lua.

Figura 1 — James Edwin Webb (1906-1992), administrador da NASA, especialmente durante os anos das missões Apolo (foto/NASA).

O Telescópio Espacial Webb (WST, de Webb Space Telescope) será o foco de nossa atenção a partir daqui.

Ao contrário do Hubble, um telescópio óptico, o Webb será um telescópio infravermelho. A cobertura em comprimento de onda é de 0,7–28 μm. A faixa de 0,7–5 μm é denominada de infravermelho próximo — está próximo ao visível. A faixa de 5–28 μm é o infravermelho médio. O Webb terá instrumentos nestas duas faixas, imageadores e espectrômetros.

O seu espelho é segmentado, constituído de 18 segmentos hexagonais feitos do metal berílio, cobertos por uma fina camada de ouro. O berílio tem a vantagem sobre o vidro de sofrer muito menor deformação devido às enormes variações de temperatura que ocorrerão na missão. O espelho do Hubble possui 2,4 m enquanto que o espelho do Webb tem 6,5 m de diâmetro. Uma comparação entre os dois espelhos é feita na Fig. 2. A área do espelho do Webb é, portanto, (6,5/2,4)2=7,3. Isto significa que ele terá a capacidade de coletar uma quantidade de fótons 7,3 vezes maior do que o Hubble, ou seja, poderá “ver”, proporcionalmente, mais profundamente em distância no cosmos!

Figura 2 — WST versus HST. A escala vertical está em metros. O espelho do Hubble é maciço e possui 2,4 m de diâmetro e o espelho segmentado (18 segmentos) do Webb está no interior de um círculo de 6,5 m de diâmetro (ilustração/NASA).

Por que infravermelho? Há várias razões. Em primeiro lugar, razões cosmológicas. Edwin Hubble (1889-1953) descobriu na década de 1920 que a luz de objetos cósmicos apresenta-se tanto mais avermelhada quanto mais distantes estão estes objetos. Desta forma, galáxias muito distantes poderão ser observadas em comprimentos de onda na faixa da radiação infravermelha. O Webb ampliará assim o alcance, em termos de distâncias cosmológicas, do telescópio Hubble. Em segundo lugar, para objetos em nossa Via Láctea e nas galáxias próximas, a luz infravermelha é capaz de atravessar as nuvens de poeira interestelar e ajudar a revelar os segredos astrofísicos nelas ocultos, como formação de estrelas e sistemas planetários. Finalmente, o Webb poderá detectar a emissão infravermelha de estrelas, em geral, das próprias nuvens de poeira — todo objeto aquecido emite no infravermelho —, estejam elas ao redor das estrelas em formação ou vagando pelo espaço, e a emissão integrada de galáxias inteiras.

O WST será colocado numa órbita muito especial visando a dois objetivos principais: estabilidade e baixo custo energético para a manutenção da mesma, e baixa temperatura ambiente. A correção orbital consome combustível dos foguetes e este combustível será levado em quantidade limitada, e a temperatura baixa é necessária para evitar a contaminação da radiação infravermelha proveniente das fontes astronômicas pela radiação ambiente.

Do ponto de vista da estabilidade, existem 5 pontos especiais no plano orbital de dois corpos que se movem numa órbita circular, sob a ação de sua atração mútua gravitacional. Nestes pontos a gravidade “efetiva” é nula, isto é, a atração gravitacional dos dois corpos sobre um terceiro corpo de massa desprezível — um corpo de prova — aí colocado e em órbita circular em torno do centro de massa do sistema, é perfeitamente equilibrada pela “força centrífuga”. Esta é uma força “fictícia” que aparece no referencial em rotação, no qual o corpo de prova está em repouso. Estes pontos são chamados de pontos de Lagrange, em homenagem ao matemático e astrônomo Joseph-Louis Lagrange (1736-1813), que os discutiu em detalhe. A Fig. 3 mostra os 5 pontos de Lagrange do sistema Sol–Terra. O ponto L2 é o que nos interessa: lá será estacionado o WST.

Enquanto orbita o Sol, juntamente com a Terra, ele permanecerá na mesma posição. Pequenas correções orbitais deverão ser realizadas periodicamente, pois o ponto L2 é um ponto de equilíbrio instável. O ponto L2 está a 1,5 milhões de quilômetros da Terra, ou seja, quase 4 vezes a distância da Lua até a Terra. A vantagem é que enquanto a Terra se move ao redor do Sol, ele a acompanha sempre na mesma posição, oposta ao Sol, à Terra e à Lua.

Figura 3 — Os cinco pontos de Lagrange do sistema Sol (bola amarela)–Terra (bola azul). Um corpo de prova colocado em qualquer um deles ficaria em repouso — relativamente ao Sol e à Terra — e em equilíbrio instável (L1, L2 e L3) e estável (L4 e L5). O WST será enviado para o ponto L2, que está a 1,5 milhões de quilômetros da Terra.

A esta distância, a temperatura ambiente é muito baixa e a blindagem do telescópio será efetiva tanto para o Sol como para a Terra e a Lua, pois eles estarão sempre do mesmo lado. O telescópio será resfriado pelo próprio contato com o meio ambiente, e é por isso que, diferentemente do Hubble, o espelho do Webb não está no interior de um tubo. A Fig. 4 mostra várias vistas do Webb. Note especialmente a blindagem solar. Ela divide o WST em dois lados: um muito quente e outro muito frio.



Figura 4 — O Telescópio Espacial Webb (WST), onde se destacam o espelho primário segmentado, o espelho secundário em seu suporte, a blindagem contra as emissões solares (vento solar e radiação eletromagnética) e os equipamentos ali instalados, sob diferentes perspectivas. Os espelhos do WST operarão permanentemente à sombra da blindagem de radiação solar (ilustrações/NASA).

O lado virado para o Sol atingirá quase 100 graus centigrados! É nesta parte onde serão colocados os painéis solares para a geração de energia elétrica, a antena para comunicação, o computador e o sistema de navegação. O lado frio do Webb, protegido pela blindagem solar, estará a 40 Kelvin! Ou seja, -233 graus Celsius. E é aí onde a parte científica da missão acontece. Aí estão os espelhos — o primário e o secundário —, os detectores de infravermelho e as rodas de filtros.

A blindagem foi projetada para dissipar o calor gerado pela iluminação solar de maneira bastante eficiente e segura. Ela é composta de cinco camadas, ou placas, feitas de alumínio. O calor que não é dissipado na primeira placa vai para a segunda placa, onde parte é dissipada, e assim sucessivamente até a quinta placa. Cada placa da blindagem terá o tamanho aproximado de uma quadra de tênis! A propósito, a massa total do WST é de 6.330 kg! Só o espelho tem 705 kg.

O Telescópio Espacial Webb terá consumido 3,5 bilhões de dólares mais as contribuições das agências européia (ESA) e canadense (CSA), totalizadas na época de sua colocação em órbita. Isto deverá ocorrer antes do final desta década. O lançamento será feito no Centro Espacial da Guiana Francesa, por um foguete Ariane da ESA, com 5 propulsores. A missão do Webb deverá durar de 5 a 10 anos.

As informações apresentadas aqui foram retiradas, na sua maioria, da página eletrônica do Telescópio Espacial Webb, onde inúmeras outras informações podem ser encontradas.



Leia outros artigos em http://www.fisica.ufmg.br/~dsoares/notices.htm.