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_____________________________________________21 de outubro de 2011

Caros Amigos da Cosmologia,

Sidney van den Bergh, astrônomo extragaláctico canadense, já apareceu aqui quando apresentei um artigo seu sobre Milton Humason, o grande espectroscopista astronômico, colaborador e amigo de Edwin Hubble (veja COSMOS:05ago11).

Agora ele aparece como autor de um pequeno artigo de 3 páginas sobre dois gigantes da astronomia extragaláctica: Edwin Hubble (1889-1953) e Harlow Shapley (1885-1972). O artigo é apropriadamente intitulado “Hubble and Shapley - Two Early Giants of Observational Cosmology” ( http://arxiv.org/abs/1110.2445).

Ele começa o seu artigo dizendo que “a cosmologia observacional das primeiras décadas do século XX foi dominada por dois gigantes: Edwin Hubble e Harlow Shapley”. A cosmologia observacional, como sabemos, seguiu-se à grande descoberta de Hubble, qual seja, a descoberta do “Reino das Nebulosas”, que é o domínio concreto da cosmologia.

Shapley não gostava de Hubble e vice-versa. Eles eram grandes rivais científicos e pessoais. Sidney van den Bergh, o autor do artigo, revela-se um partidário de Shapley. Isto pode ser lido nas entrelinhas do artigo. Em alguns trechos o nível é baixo. Vejam: Sidney diz que Harlow dizia que Edwin não gostava de gente... Que ele não se associava com as pessoas, que ele não se importava de trabalhar com elas. Isto aparece no primeiro parágrafo do artigo e nos informa qual é a posição do autor. Ele segue uma certa tendência moderna de rever e diminuir a contribuição científica de Hubble.

Mas este tom não diminui a qualidade do artigo. Vale a pena a leitura, pois o autor apresenta algumas novidades interessantes.

Por exemplo, Sidney van den Bergh é estudioso renomado das galáxias lenticulares, as S0s (vejam meu artigo sobre elas em lenticular.htm). Ele diz que as S0s aparecem exatamente na bifurcação da forquilha de Hubble, e que com isto Hubble queria dizer que elas representavam uma transição entre as galáxias elípticas e as espirais. Ele continua, dizendo que só meio século depois foi verificado que as galáxias lenticulares possuem, em média, a metade do brilho intrínseco das elípticas e das espirais. E que portanto não poderiam ser uma transição entre elas.

Ora, há apenas uma parte da verdade nesta argumentação. Em primeiro lugar, Hubble nunca expressou ipsis litteris que a classe S0 seria uma classe de transição evolucionária entre as Es e as Ss. Ele pode ter lançado a isca — como Miltom Humason gostava de fazer para os peixes de verdade —, para que os tolos a abocanhassem. Hubble não tinha certeza desta transição, e ele colocou as S0s como uma transição morfológica em seu sistema de classificação. Nada havia de evolução dinâmica na forquilha. Ela era apenas um esquema de classificação de formas e não uma sequência evolutiva. Hubble sabia, no entanto, que muitos ansiavam por uma sequência evolutiva. Ele pode ter sugerido de forma indireta e não comprometedora que a sequência poderia ser evolutiva. E quase todos morderam a isca. Entre eles, certamente, Sidney van den Bergh.

Vamos aos fatos, quanto a Shapley. Não falarei sobre Hubble, por desnecessário.

Sidney van den Bergh não mencionou um fato curioso, que aparece na melhor biografia de Hubble, aquela escrita por Gale Christianson e intitulada “Edwin Hubble, o Navegador das Nebulosas”. Hubble nunca utilizou o termo “galáxia” para designar as nebulosas extragalácticas que ele acabara de descobrir. Por quê? Simplesmente porque este era o termo preferido de Shapley...

Termino parodiando Isaac Newton, na forma com que ele se gabava de seus resultados sensacionais em óptica, frente aos seus ultra rivais e desafetos Descartes e Hooke: se Hubble pôde ver mais longe foi por estar sobre os ombros de gigantes. Shapley obviamente era um deles. Newton nunca disse mas, com certeza, secretamente e mais de uma vez, ruminou consigo mesmo: “Eu vi mais longe... aos gigantes, as batatas!”.

Hubble viu mais longe.

Um abraço a todos.

Saudações Cosmológicas,

Domingos

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Domingos Sávio de Lima Soares
Página Pessoal
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