Ondas gravitacionais, conseguimos detectá-las?


Domingos Soares

17 de outubro de 2016



1. O anúncio

Uma onda gravitacional (OG) é uma perturbação no espaço, que se propaga com a velocidade da luz, prevista por Albert Einstein (1879-1955) em 1916. A figura 1 mostra um exemplo de produção de uma OG, a saber, um corpo de massa variável em rotação. A amplitude da onda será tanto maior quanto maior for a variação de massa.



Figura 1

A OG é produzida por uma distribuição de massa variável, como neste exemplo em que o corpo de massa variável está em rotação (ver mais detalhes em Gravitational Waves de autoria de Teviet Creighton.


Em fevereiro deste ano o observatório LIGO reivindicou a descoberta de dois fenômenos extraordinários: a fusão de buracos negros e a consequente detecção das OGs emitidas no processo de fusão e pelo buraco negro (BN) único resultante desta fusão. Os eventos foram observados em setembro de 2015. Vejam o trecho do resumo do artigo da descoberta, ou melhor, da “descoberta” (as aspas podem ser temporárias, reconheço, mas ainda precisamos delas):

These observations demonstrate the existence of binary stellar-mass black hole systems. This is the first direct detection of gravitational waves and the first observation of a binary black hole merger.
(os sublinhados são meus)

O sistema binário de BNs é um sistema de massa variável e no caso da descoberta do LIGO cada BN possui cerca de 30 massas so Sol e o sistema possui um período orbital de décimos de segundo. Trata-se, portanto, de uma variação espaçotemporal de massa gigantesca, gerando, ainda assim, uma onda de amplitude correspondente a um décimo milésimo do diâmetro de um próton. Daí a dificuldade extrema de detecção, mesmo neste caso. A figura 2 mostra as observações e as três fases da fusão dos BNs.



Figura 2

O diagrama à esquerda mostra, na parte de cima, as três fases de um sistema binário de BNs no processo de emissão de OGs. A primeira fase é o “espiralamento” (inspiral), a segunda é a fusão (merger) e a terceira é a reverberação (ring-down). O diagrama abaixo mostra a simulação numérica da OG emitida no processo. A maior parte de energia irradiada ocorre no espiralamento, quando os BNs espiralam um em direção ao outro. Note que tudo ocorre em décimos de segundo e que a massa de cada BN é de aproximadamente 30 massas do Sol, fazendo com que este seja um fenômeno extremamente energético, nunca antes observado. A separação inicial do espiralamento é de aproximadamente 800 km e os BNs estão confinados a esferas de 100 km de raio (ver seção 3). À direita, os perfis da OG observados pelos interferômetros H1 e L1 (ver figura 3). O perfil de H1 foi deslocado (shifted), por causa da diferença do tempo de recepção do sinal de 6,9 ms, e invertido (inverted), por causa das diferentes orientações dos braços dos interferômetros (ver figura 3). O eixo vertical, aqui e na simulação numérica, mostra a deformação (strain) espacial produzido pela OG (ver seção 1.1 a seguir). Estas figuras foram extraídas do artigo da descoberta (referência na seção 4).


Quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha? O que se descobriu primeiro, as ondas ou a fusão de um BN binário? Naturalmente, os fenômenos são ligados um ao outro. Se um existe, o outro também existe. Se um não existe, o outro também não existe.

Portanto, devemos ter cautela em nosso entusiasmo. O problema é que muitos físicos e não físicos, admiradores de Einstein, desejam ardentemente acreditar na descoberta das OGs e deixam-se cegar pela emoção.

Duas sugestões de ótimas leituras a seguir.

Uma de divulgação científica em Gravitational Waves Discovered from Colliding Black Holes e outra, o artigo da descoberta, que apresenta ótimas informações qualitativas, além da parte técnica, em Observation of Gravitational Waves from a Binary Black Hole Merger.

Prêmio Nobel à vista? Longe disto, mas as “loucuras” que vêm acontecendo nos comitês Nobel nos impede de ter muita segurança em qualquer previsão.

A situação aqui comentada é semelhante, em alguns aspectos, à ocorrida em 1919, por ocasião da tentativa de comprovação observacional da deflexão gravitacional da luz pelo Sol. Isto verificaria a existência da curvatura do espaço, uma característica fundamental da Teoria da Relatividade Geral (TRG). O eclipse solar daquele ano era uma excelente oportunidade para se medir o encurvamento da luz proveniente de estrelas vistas próximas ao disco solar. Duas expedições foram realizadas pelos ingleses, sob a liderança do Arthur Eddington (1882-1944), maior autoridade, na época, em TRG. Uma das equipes dirigiu-se a Sobral, no Ceará. Então, a quase certeza do resultado positivo para a previsão da TRG, relativamente ao valor do desvio angular da luz, fez com que os astrônomos da época passassem por cima de problemas técnicos importantes, os quais prejudicaram de forma decisiva as conclusões, impedindo uma distinção entre as previsões da TRG e da gravitação clássica. Décadas depois, a deflexão einsteiniana viria a ser comprovada, com a utilização de técnicas mais refinadas.

Agora, como em 1919, a pressão por resultados — o investimento no projeto LIGO monta a bilhões de dólares — levou à precipitação no anúncio dos resultados científicos. Resta-nos aguardar pela confirmação observacional deste fenômeno. Por enquanto temos apenas indícios teórico-observacionais das OGs.

1.1. Laser Interferometer Gravitational Wave Observatory (LIGO)

LIGO é um interferômetro cujos principais elementos são duas cavidades ópticas dispostas como dois braços perpendiculares de 4 km de extensão cada um. A onda deforma o espaço de tal forma que encolhe um dos braços e distende o outro. A alteração é medida por uma grandeza adimensional denominada deformação (strain em inglês). A deformação é igual à alteração relativa do espaço, por exemplo, se o comprimento de um braço passa de d para d+Δd, então a deformação s = Δd/d, onde Δd é a variação no comprimento do braço. A deformação é uma representação quantitativa da OG e possui frequência e amplitude variáveis. As OGs são ondas transversais, quer dizer, as deformações são produzidos no plano perpendicular à direção de propagação da onda (mais detalhes no artigo da descoberta).

Através de espelhos especiais, um raio laser divide-se para os dois braços percorrendo distâncias diferentes e interferindo ao final dos percursos. O resultado da interferência permite medir-se a amplitude da OG incidente.

Os dois interferômetros estão separados por 3.000 km, ambos localizados nos Estados Unidos, conforme mostra a figura 3 (que é a figura 3 do artigo da descoberta). Um deles (H1) está na cidade de Hanford, estado de Washington, extremo noroeste dos Estados Unidos, e o outro (L1) na cidade de Livingston, estado de Luisiana, sudeste do país. A separação entre os interferômetros permite determinar-se a a região onde se localiza a fonte da OG, chamada GW150914, analisando-se a diferença entre os tempos de recepção do sinal nos dois interferômetros. A separação de 3.000 km corresponde a uma diferença de tempo de propagação da onda de 3.000 km/300.000 km/s = 10 milissegundos (ms), em que 300.000 km/s é a velocidade da luz.



Figura 3

Os dois interferômetros do LIGO H1 e L1 estão separados por 3.000 km, como mostra o mapa dos Estados Unidos no alto e à esquerda. As duas cavidades ópticas possuem 4 km de extensão cada e formam uma estrutura de dois braços perpendiculares. A OG distende um braço e contrai o outro. O gráfico à direita mostra o ruído da deformação espacial, nos dois interferômetros, em função da frequência do sinal, no instante da detecção (reprodução da figura 3 do artigo da descoberta das OGs).


Então, uma análise simples nos informa que (i) se a fonte estiver localizada na direção da linha que une os dois interferômetros, o atraso temporal deveria ser de 10 ms; (ii) se a fonte estiver na direção perpendicular a esta linha, não haveria atraso na recepção e (iii) qualquer atraso entre 0 e 10 ms corresponde a uma direção de propagação intermediária entre os casos (i) e (ii).

O atraso observado foi de 7 ms, o que nos informa que a fonte está localizada numa direção que faz um ângulo de ≈ 45 graus com a linha entre os dois LIGOs, na verdade, a fonte está sobre um círculo no céu que subtende um ângulo de ≈ 45 graus com a linha dos interferômetros H1 e L1 (ver mais detalhes na referência An analysis of the LIGO discovery based on Introductory Physics, citada na seção 4, e na figura 4 abaixo).



Figura 4

O diagrama à esquerda mostra que o atraso na recepção do sinal em H1 (cf. o problema 3, item b, de An analysis of the LIGO discovery based on Introductory Physics) vale Δt = l/c = dcosθ/c. Como o atraso registrado foi de 0,7 ms e d = 3.000 km, conclui-se que θ ≈ 45o. À direita, vemos o cone que delimita a região do céu onde a fonte pode estar situada. Uma análise mais detalhada do atraso na recepção melhora consideravelmente a delimitação da posição da fonte (ver seção II, item Directional information, do artigo mencionado aqui).


2. Ithaca, NY e as OGs

A cidade norte-americana de Ithaca, no interior do estado de Nova Iorque é o berço de uma das maiores universidades dos Estados Unidos, a Universidade Cornell (UC), onde eu tive a oportunidade de realizar estágio de pós-doutoramento em 1997-1998 na minha área de pesquisa, galáxias binárias. Trabalhei com o astrofísico teórico Edwin Salpeter (1924-2008) e o astrônomo Yervant Terzian. A propósito, a UC é a universidade de Carl Sagan (1934-1996). Em 1997, quando eu lá estava, Ed Salpeter foi agraciado, junto a Fred Hoyle (1915-2001), com o prêmio Crafoord, o equivalente ao prêmio Nobel na área de astronomia (leiam mais detalhes sobre o prêmio Crafoord em meu artigo intitulado O prêmio Nobel de Hubble).

A minha sala no Departamento de Astronomia, no sexto e último andar do Space Science Building da UC, localizava-se ao lado da sala do astrofísico teórico Saul Teukolski, com quem conversei algumas vezes. Ele é coautor de dois importantes livros de referência em pesquisa, o Numerical Recipes: The Art of Scientific Computing e Black Holes, White Dwarfs and Neutron Stars: The Physics of Compact Objects. Teukolski é o líder de um grupo de pesquisa que realizou as simulações computacionais de fusão de objetos compactos (comumente chamados, no caso de compactação extrema, de “buracos negros”) que levaram, em conjunto com as observações do LIGO, à afirmação recente da descoberta da radiação gravitacional. A UC celebrou o fato com a reportagem Cornell theorists affirm gravitational wave detection.

Kip Thorne é renomado físico teórico, que já trabalhou em Cornell e foi estudante de John Archibald Wheeler (1911-2008), com quem escreveu o importante livro de referência em TRG Gravitation. Em seminário proferido em abril deste ano na UC, Kip Thorne abordou o tema Probing the Warped Side of our Universe with Gravitational Waves and Computer Simulations, ou seja, ele já se prepara para utilizar esta nova janela de investigação do universo, qual seja, aquela proporcionada pelas OGs. Saul Teukolski e seus colegas estavam na plateia no seminário de Cornell, seminário que tive a oportunidade de assistir.

Kip Thorne é também um dos idealizadores do LIGO, o observatório de OGs. A ideia original era a de se observar OGs geradas em explosões de estrelas massivas (supernovas) ou em fusões de estrelas anãs. Logo concluiu-se que a sensibilidade do LIGO não seria suficiente para tal. Foi Kip Thorne quem sugeriu a observação de OGs geradas na fusão de objetos compactos como estrelas de nêutrons ou BNs. Como tais eventos nunca foram observados em nenhuma forma, eles tiveram que ser simulados numericamente em computadores. Os resultados das simulações são então comparados com as observações. A delicadeza de tais observações é enorme. A sensibilidade do LIGO para ser capaz de se conformar às previsões teóricas é de 10-17 cm!!! O observatório é formado por duas cavidades ópticas dispostas em forma de dois braços perpendiculares, cada um dos braços com alguns quilômetros de comprimento. O espaço expande-se num braço e contrai-se no outro, devido à passagem da OG. A variação de comprimento é da ordem de 10-17 centímetro. Lembremo-nos que a dimensão do núcleo atômico é da ordem de 10-13 cm, ou seja 10.000 vezes maior que a sensibilidade requerida para o LIGO. É uma pena que se passou da observação de objetos conhecidos (supernovas e fusões de estrelas anãs) para a observação de objetos desconhecidos, ou conhecidos apenas precária e teoricamente (ainda não temos uma teoria de gravitação quântica para o completo entendimento de objetos compactos extremos como os BNs).

A expectativa para as fontes das primeiras OGs a serem observadas era, segundo a astrofísica do Departamento de Física da Universidade de Nova Iorque Maryam Modjaz, a de fusões de estrelas anãs. A surpresa para a fonte ser uma fusão de BNs foi dupla: primeiro, o fato de ser uma fusão de BNs e segundo o fato de serem BNs de massas tão grandes, da ordem de 30 massas solares. Os maiores BNs estelares previstos de existirem em nossa galáxia possuem massas da ordem de 15 massas solares. Segundo a astrofísica, é difícil imaginar que tipo de estrela pode dar origem a BNs de massa tão grande como os dos modelos da descoberta das OGs.

3. Comentários adicionais

O anúncio do LIGO é extremamente importante, pois trata-se da primeira reinvindicação da detecção de OGs na história da ciência moderna. Se confirmada a descoberta, por meio de novas detecções, trata-se de realização extraordinária do engenho humano, tanto teórico (Einstein), quanto experimental (projeto LIGO).

As OGs representam uma nova ferramenta para o estudo do universo, em outras palavras, abre-se uma nova janela para se investigar a natureza. Sendo assim, a confirmação de sua detecção aumentará as possibilidades de que o ser humano possa conhecer cada vez mais sobre o universo. Nada é mais nobre e engrandecedor para a vida humana do que o aumento do conhecimento sobre nós e sobre o meio em que vivemos. A iniciativa do projeto LIGO se encaixa na busca eterna do ser humano por mais conhecimento.

Um BN é caracterizado pelo chamado horizonte de eventos, que é uma superfície esférica cujo raio é o chamado raio de Schwarzschild RS = 2GM/c2 = 3 (M/MSol) km, onde M é a massa do BN, G é a constante da gravitação universal, c é a velocidade da luz no vácuo e MSol é a massa do Sol. A massa do BN está toda confinada ao interior da superfície de raio RS, que é a superfície do horizonte de eventos do BN. Note que o raio de Schwarzschild de um BN cuja massa M seja igual à massa do Sol vale 3 km. Os BNs da descoberta possuem 29 e 36 massas solares, o que resulta em RS = 90 e 110 km, respectivamente. Para comparação, o raio do Sol vale 700.000 km.

O horizonte de eventos representa um limite para o qual a métrica espaçotemporal no exterior de uma massa M deixa de ser conhecida, isto é, a partir dali a TRG não é mais válida. Em outras palavras, o horizonte de eventos representa o limite de nosso conhecimento relativamente à gravitação de uma distribuição esférica de massa M. Podemos, no entanto, calcular qual seria a densidade média no interior de uma esfera de raio igual a RS, a qual poderíamos denominar densidade do BN. A densidade vale d = M/(4/3πRS3) = 3c6/(32πG3M2). Esta equação mostra que a densidade do BN é inversamente proporcional ao quadrado da sua massa M. Podemos então ter BNs de densidades tão pequenas quanto imaginarmos. Por exemplo, para quais massas teríamos BNs com densidades menores do que a densidade da água, à temperatura e pressão ambientes, igual a 1 g/cm3? Usando a equação para a densidade encontramos que BNs com M > 24 milhões de massas do Sol terão densidades no interior do horizonte de eventos inferior à densidade da água. BNs com massas deste valor ou superiores são cogitados de existirem no centro de algumas galáxias, inclusive de nossa Via Láctea. Então, a principal característica de um BN não é a de ser um objeto de altíssima densidade, como muitas vezes se acredita, mas, entre outras características, a de possuir a velocidade de escape no horizonte de eventos igual à velocidade da luz; nada escapa à gravitação de um BN, nem mesmo a luz. Um dia teremos uma teoria que explique com mais precisão o que acontece antes e depois do horizonte de eventos da TRG para o BN. Por enquanto possuímos apenas elucubrações teóricas nesta questão.

Agora, com o caso das OGs, e em 1919, com a tentativa de se comprovar a curvatura do espaço da TRG, os limites do conhecimento teórico e das técnicas observacionais foram levados, simultaneamente, ao extremo. É natural, portanto, que em ambas as situações se encontre espaço para o questionamento dos resultados. Em 1919 a questão principal era a precariedade experimental e agora a principal questão é a reinvindicação de uma descoberta acoplada a um evento nunca antes observado, qual seja, a fusão de BNs, e além do mais de BNs de origem estelar de massas muito grandes até então não previstos de existirem. Um exemplo análogo é o da afirmação de que uma nova teoria física cosmológica funciona, porque ela consegue, por exemplo, obter a equação de estado da energia escura. Ora, a energia escura é uma hipótese de trabalho da cosmologia moderna cuja existência ainda não foi comprovada. Ela não serve, portanto, de parâmetro para a validação de uma nova teoria física.

Incidentalmente, os eventos de Sobral, no Ceará, de fato, não comprovaram a supremacia da TRG sobre a teoria de gravitação newtoniana, mas deixaram marcas culturais e educacionais na cidade, as quais se manifestam, certamente, até aos dias de hoje. Os resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2015 — o mais recente — mostraram que Sobral foi destaque nacional na última avaliação dos anos iniciais do ensino fundamental (primeiro ao quinto ano), tendo ocupado o primeiro lugar no Brasil para o quinto ano, e o segundo lugar nacional para ano final (nono ano).

O observatório LIGO funciona, de certa forma, como um sismógrafo ultrassensível. Ondas sísmicas direcionais amortecidas podem perturbar de forma diferente os braços dos interferômetros. Pode-se, como primeiro passo nesta possibilidade, investigar-se o registro de atividades sísmicas nos Estados Unidos nas épocas dos eventos observados pelo LIGO.

Grosso modo, a variação da deformação descrita pelo LIGO são semelhantes a muitos processos periódicos amortecidos (forçados ou não) e podem estar associados a outros eventos naturais diversos de uma OG. Um quadro alternativo necessita de uma análise exaustiva e detalhada para se ajustar às observações. A hipótese das OGs mais fusão de BNs têm a seu favor um ajuste coerente das teorias às observações e o ponto fraco a consideração de um fenômeno desconhecido, a saber, a fusão de BNs.

As fusões de BNs devem se manifestar também na emissão copiosa de radiação eletromagnética, inclusive na faixa do visível. As buscas das contrapartidas ópticas dos eventos de fusão declarados pelo LIGO até agora não tiveram sucesso.

Logo após o anúncio da descoberta das OGs feito pelo LIGO, apareceram trabalhos sugerindo que os BNs de 30 massas do Sol não eram estelares mas sim BNs primordiais. Estes BNs aparecem no quadro geral do Modelo Padrão da Cosmologia (MPC, o modelo do Estrondão Quente) e não são BNs originários de estrelas colapsadas, mas do colapso de concentrações de massa existentes nos primeiros segundos da expansão do MPC. Note-se, portanto, a preocupação existente no meio científico em se acomodar os ajustes teórico-observacionais do LIGO dentro de um esquema plausível relativamente aos BNs. Além disto, os BNs primordiais são cogitados de representarem a matéria escura não bariônica necessária à vindicação do MPC. Temos aqui, no entanto, um complicador adicional já que o MPC não é um modelo teórico solidamente estabelecido, pois se sustenta sobre componentes de matéria-energia ainda não observados (matéria escura e energia escura).

4. Referências

Alguns artigos mencionados aqui estão disponíveis em COSMOS:12fev16, COSMOS:06abr16 e COSMOS:15abr16. O artigo da descoberta das OGs está livre para consulta no repositório eletrônico, sediado na UC, em arXiv-OGs.

A página eletrônica do LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory) está em www.ligo.caltech.edu/. Destacam-se entre as várias seções, as de notícias e de recursos educacionais.

Os resultados apresentados no artigo da descoberta das OGs foram obtidos utilizando-se conceitos e ferramentas de física introdutória no artigo An analysis of the LIGO discovery based on Introductory Physics. Os dados observacionais são extraídos da figura 1 do artigo da descoberta e junto a equações de física básica são usados nas estimativas das massas dos BNs, da distância do evento, da separação inicial do par, da tremenda quantidade de energia liberada no evento (aproximadamente 4MSol×c2 em 0,1 segundo), entre outras grandezas. As grandezas calculadas estão em boa concordância com as grandezas deduzidas pela equipe do LIGO. Os físicos e estudantes de física e engenharia (com um bom ciclo básico de física) são fortemente encorajados a se debruçarem sobre este artigo e a refazerem as suas contas. (A propósito, há um pequeno erro tipográfico em uma equação apresentada no início da seção II; corrijam-no antes de seguirem em frente.) Há ainda um apêndice com uma lista de sete problemas de dificuldade variada. Imediatamente após o aparecimento desta publicação, a equipe do LIGO apresentou também um artigo da mesma espécie intitulado The basic physics of the binary black hole merger GW150914, que também merece um estudo detalhado; ele está disponível em arxiv.org/abs/1608.01940.

Os acontecimentos relativos ao eclipse solar de 1919 foram discutidos por mim nos artigos Visita ao Museu do Eclipse em Sobral (2014) e A Real Importância de Sobral na Ciência Moderna (2006).

Em 15 de junho deste ano foi anunciada uma segunda detecção de OGs originárias de fusão de BNs. Os BNs que se fundiram possuem massas bem menores, 14.2 e 7.5 massas solares e o BN final 20.8 vezes a massa do Sol. Por serem menores, o sinal registrado é mais fraco. Leiam a notícia completa. Há ainda uma terceira detecção, também originária de fusão de BNs, mas de menor significância estatística (cf. arxiv.org/abs/1606.04856).

As buscas, até agora sem sucesso, das contrapartidas ópticas dos eventos de fusões de BNs são discutidas no artigo Experimentally, How Dark Are Black Hole Mergers? em arxiv.org/abs/1609.09517.

Um comentário sobre a possibilidade de que os BNs do LIGO sejam BNs primordiais apareceu no artigo LIGO’s black holes may be dark matter. Trata-se de um artigo de divulgação científica, mas que contém as referências técnicas sobre o assunto. Um informe da NASA também tratou do mesmo assunto em maio deste ano em NASA Scientist Suggests Possible Link Between Primordial Black Holes and Dark Matter.

Estrondão Quente é a tradução de Hot Big Bang — i.e., o MPC — sugerida por mim e por alguns de meus alunos de cosmologia; ver A tradução de Big Bang.

Várias questões surgiram após o Café Controverso. Algumas delas estão apresentadas em COSMOS:23out16.



Agradecimento – Aos professores Leonardo Marques Soares e Silvania Sousa do Nascimento, coordenadores do Espaço do Conhecimento da UFMG, pelo convite para participar do Café Controverso sobre “Ondas gravitacionais”. Este artigo resultou de minhas reflexões a respeito do tema.


 

Apêndice

Roteiro para a apresentação inicial do Café Controverso

O artigo acima foi escrito como preparação para o evento Café Controverso, realizado pelo Espaço do Conhecimento da UFMG em 22 de outubro de 2016. Leiam COSMOS:17out16 (antes do evento) e COSMOS:23out16 (depois do evento) para mais detalhes.

O Café iniciou-se com as apresentações introdutórias dos dois debatedores, o Prof. Carlos Molina e eu.

Preparei para a minha apresentação introdutória um roteiro com 9 itens. A seguir a lista destes itens, os quais podem proporcionar um entendimento geral da questão das OGs.



Itens 6 e 7

O diagrama à esquerda mostra o esquema de um interferômetro de Michelson, como os utilizados no LIGO, e a imagem da direita franjas de interferência observadas num experimento com um interferômetro deste tipo.




Atualização: 04nov16
Leia outros artigos em www.fisica.ufmg.br/~dsoares/notices.htm.