14 de setembro de 2022
As galáxias estão distribuídas no espaço cósmico de maneiras
diversas. Algumas vezes elas estão muito distantes umas das
outras. Quando em grupos, as galáxias podem interagir
fortemente, e, em virtude desta interação, perder completamente
a sua individualidade. Dois fenômenos podem ocorrer neste caso.
A fusão, quando duas galáxias de tamanho comparável se
juntam, fundindo-se em uma só, e o canibalismo galáctico,
quando uma galáxia, literalmente, “engole” uma companheira
de muito menor tamanho. Mostrarei a seguir alguns exemplos
de canibalismo entre as galáxias, e descreverei como ocorre
este fenômeno e algumas das características da galáxia canibal,
que é, nos casos mais espetaculares, uma gigantesca galáxia!
Para começar vamos ver uma imagem extraordinária. Trata-se de uma galáxia canibal localizada no centro de um aglomerado de galáxias. A propósito, a maioria das galáxias canibais é encontrada nos centros de grandes aglomerados. O motivo é muito simples: é lá que se encontra “comida” em abundância. Vejam na figura a galáxia central do aglomerado de galáxias denominado Abell 3827. Este aglomerado está localizado a 1,5 bilhão de anos-luz. O que vemos na imagem era a situação há 1,5 bilhões de anos. Ou seja, hoje, muitas das galáxias vistas em sua periferia já terão sido canibalizadas!
O grande protagonista do fenômeno do canibalismo galáctico é a força da gravidade. A canibalização ocorre em duas etapas principais. Em primeiro lugar, a atração gravitacional da galáxia canibal age no sentido de arrancar as estrelas mais externas da galáxia alimento. A força da gravidade varia em intensidade através da galáxia alimento. Na sua parte mais próxima ela é maior, e é menor nas regiões mais afastadas. Este tipo de força é denominado “força de maré”. O seu nome vem de seu efeito mais comum, qual seja, as marés oceânicas na Terra, provocadas principalmente pela atração gravitacional da Lua sobre os oceanos. Pois bem, as forças de maré arrancam as estrelas externas do “alimento”, tanto da parte mais próxima quanto da parte mais afastada.
As estrelas arrancadas do alimento poderão ser
agregadas à galáxia canibal ou ser arremessadas em
altas velocidades na direção do meio intra-aglomerado. A
galáxia canibal cresce em massa e brilho e o espaço
existente entre as galáxias do aglomerado é povoado
com estrelas solitárias, originadas das galáxias canibalizadas.
A galáxia alimento fica reduzida à sua região central, a qual
possui uma densidade maior de estrelas. Elas tornam-se
progressivamente em um “caroço” estelar. E é quando
se torna mais importante a segunda etapa do canibalismo.
Em segundo lugar, então, os núcleos densos das pequenas galáxias vão progressivamente perdendo energia orbital. Esta perda de energia ocorre devido à sua interação gravitacional com as estrelas da galáxia canibal. O alimento orbita por um meio onde existem muitas estrelas. Ocorre uma espécie de força de atrito, que freia o seu movimento, retirando energia da sua órbita. Esta força de atrito não é uma força de contacto direto. Ela é uma força dinâmica de origem gravitacional. O destino do alimento é a região mais central da galáxia canibal. Estes são os caroços que aparecem na imagem de Abell 3827.
Veremos a seguir outro exemplo surpreendente de canibalismo galáctico. Ele ocorreu na galáxia elíptica gigante NGC 1316, localizada na constelação da Fornalha. A galáxia está localizada a 70 milhões de anos-luz. A sua luz partiu em nossa direção quando os dinossauros ainda andavam pela Terra, e só agora, devido à sua imensa distância, chegou aos nossos telescópios!
NGC 1316 é uma poderosa fonte de ondas de rádio. Esta
atividade energética está associada diretamente ao seu
canibalismo. O gás e a poeira engolidos pela canibal caem
em direção ao centro galáctico e lá ocorre o seu colapso
violento em direção a uma usina energética compacta
central. O melhor candidato para esta usina energética é
um “buraco negro”, um hipotético habitante do cosmos
cujas vizinhança é caracterizada por um altíssimo campo
gravitacional. A força gravitacional resultante deste campo
atrai o material canibalizado, o qual atinge velocidades
elevadíssimas, passando a irradiar em vários comprimentos
de onda, inclusive em ondas de radiofrequência. NGC 1316
é conhecida como a radiofonte Fornalha A. A imagem
seguinte mostra a dramaticidade da situação.
O canibalismo galáctico se manifesta de forma mais espetacular
quando ocorre em galáxias gigantes, como vimos. Mas ele
pode ocorrer sempre que uma galáxia, mesmo de tamanho
comum, engole uma companheira bem menor, ou seja, uma
galáxia satélite. É o que parece estar acontecendo com a nossa
vizinha, a galáxia de Andrômeda (M31). Os astrônomos
detectaram, através de observações detalhadas, detritos estelares
espalhados nas proximidades da galáxia.
E mesmo a nossa Via Láctea pode estar em pleno processo de canibalização de seus satélites mais próximos, a Grande Nuvem e a Pequena Nuvem de Magalhães! Já foram observados detritos gasosos, formando extensos filamentos, os quais emanam das Nuvens em direção à Via Láctea. Estes filamentos gasosos seriam indicações de que um processo de canibalização está em pleno andamento. Daqui a algumas centenas de milhões de anos, portanto, poderemos não ter mais as Nuvens de Magalhães embelezando os nossos céus!
Um pouco mais:
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Domingos Soares
FLORESTA COSMOS
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