Entrevista sobre o Telescópio Espacial Hubble

Domingos Soares

29 de setembro de 2021


1. Introdução

Esta entrevista foi realizada a convite da estudante Gabrielle Souza, aluna do 3° ano do Ensino Médio no Colégio Salesiano Santa Teresinha, localizado na zona norte da cidade de São Paulo, SP. Ela faz parte de um grupo de alunos que faz um trabalho escolar sobre o projeto do Telescópio Espacial Hubble.

A entrevista foi realizada no dia 29 de setembro de 2021, via Zoom. Antes da entrevista a Gabrielle enviou-me algumas perguntas que representam o interesse de seu grupo. Estas perguntas foram discutidas na entrevista. Na próxima seção apresento as minhas respostas feitas como preparação para a entrevista propriamente dita. O que ocorreu na entrevista está documentado na gravação apresentada aqui (Google Drive) ou aqui (OneDrive).

O Telescópio Espacial Hubble será referido a seguir pela sigla HST, que significa Hubble Space Telescope ou por Hubble. Estas são maneiras comuns de se referir ao telescópio, tanto em inglês, quanto em outros idiomas.

2. Questionário sobre o Telescópio Espacial Hubble

O HST é um telescópio refletor, com um espelho de 2,4 m de diâmetro (abertura do telescópio). O telescópio possui cinco instrumentos ligados ao espelho primário. Eles são: três instrumentos de imagem, dois para a luz visível e um para a luz infravermelha, um espectrógrafo, e sensores finos para guiagem do apontamento do telescópio. Estes sensores são ligados a uma luneta que apontam para estrelas guias e mantêm o telescópio com o apontamento preciso para o objeto que está sendo observado.

Todo o conjunto necessita de energia elétrica, a qual é fornecida por dois grandes painéis solares (2,4 m por 12,1 m cada) e por baterias de níquel-hidrogênio, carregadas pelos painéis. Estas são usadas nos períodos em que o HST fica na sombra da Terra durante 25 minutos do período orbital de 97 minutos.

O HST possui ainda antenas para comunicação com a base em Terra e computadores de bordo (mais detalhes em O Telescópio Espacial Hubble).

Em 2007 , através do edital “Popularização da Ciência e Tecnologia”, da FAPEMIG (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais) propus o projeto “O Reino das Galáxias”. Trata-se de um projeto de divulgação científica, com a duração de 24 meses, e que tem como público alvo estudantes de ensino médio e leigos em geral, e visa a produção de textos sobre a Astronomia Extragaláctica.

Na lista dos 24 ensaios que escrevi, não poderia faltar um texto sobre o HST, dada a sua influência enorme em todas as áreas da astronomia, particularmente da astronomia extragaláctica.

Os ensaios do projeto podem ser vistos em minha página eletrônica no endereço O Reino das Galáxias.

O Hubble está em órbita aproximadamente circular da Terra a uma altitude de 535 km acima da superfície terrestre. Ele completa uma volta a cada 97 minutos, a uma velocidade de 8 km/s (28.800 km/h).

A sua órbita está inclinada de 28,5 graus em relação ao equador. Então ele pode ser melhor visto a partir de locais na Terra localizados entre a latitude 28,5 graus norte e 28,5 graus sul. O HST aparece, quando mais brilhante, como uma estrela de magnitude 1, ou seja, como a estrela mais brilhante do Cruzeiro do Sul. Duas páginas na internet podem auxiliar na procura do HST no céu: N2YO.com e Heavens-Above. Veja mais explicações em You can see the Hubble Space Telescope in the sky above de autoria de Tanya Hill, astrônoma extragaláctica australiana.

Então, para saber onde o Hubble está em determinado momento é necessário utilizar um calculador de efemérides como os dois mencionados acima. E ele pode ser visto no céu com relativa facilidade.

As respostas a esta pergunta certamente dependem da área de atuação do astrônomo questionado. Eu sou astrônomo extragaláctico e desta forma considero que as principais descobertas do Hubble estão nesta área. Destaco duas:
A) “Projeto Chave do Hubble para a determinação da constante de Hubble”, que visou determinar as distâncias até as galáxias utilizando a relação período-luminosidade de estrelas cefeidas (ver Henrietta Leavitt e a régua cósmica). Este projeto encerrou-se em 2001 e propiciou a determinação da constante de Hubble com grande precisão. A constante de Hubble é um dos parâmetros mais importantes da cosmologia moderna.

B) “Campo Ultra Profundo do Hubble”, que representa a observação mais profunda em distância e em tempo retrospectivo de um campo astronômico. O HST observou uma pequeníssima região do céu localizada na constelação da Fornalha, próxima da conhecida constelação de Órion, cuja área é aproximadamente um centésimo da área aparente da Lua cheia. A observação foi feita durante um tempo de exposição equivalente a 11,3 dias ou cerca de 1 milhão de segundos. Estima-se que o campo contenha mais de 10.000 galáxias. As galáxias maiores na imagem são as mais próximas. A maioria das galáxias aparecem como pequenas manchas disformes. Esta observação permitiu um estudo bem fundamentado da evolução das galáxias, bem como mostrou de forma inequívoca que existem pelo menos 125 bilhões de galáxias no universo. Pelo menos até a profundidade na qual o Hubble fez a observação. Outros detalhes em As galáxias mais distantes.

O HST continua em operação por um bom tempo ainda, talvez até 2030-2040. Mas o grande novo desenvolvimento observacional no espaço será colocado em órbita da Terra no final deste ano. Trata-se do “Telescópio Espacial James Webb”. O espelho do Hubble possui 2,4 m de diâmetro enquanto o espelho do Webb tem 6,5 m. Ao contrário do Hubble, que opera predominantemente na faixa do visível, o Webb será um telescópio infravermelho. A cobertura em comprimento de onda é de 0,7–28 μm. A faixa de 0,7–5 μm é denominada de infravermelho próximo — está próximo ao visível. A faixa de 5–28 μm é o infravermelho médio. O Webb terá instrumentos nestas duas faixas, imageadores e espectrômetros.

Por que infravermelho? Há várias razões. Em primeiro lugar, razões cosmológicas. Edwin Hubble (1889-1953) descobriu na década de 1920 que a luz de objetos cósmicos se apresenta tanto mais avermelhada quanto mais distantes estão estes objetos. Desta forma, galáxias muito distantes poderão ser observadas em comprimentos de onda na faixa da radiação infravermelha. O Webb ampliará assim o alcance, em termos de distâncias cosmológicas, do telescópio Hubble. Em segundo lugar, para objetos em nossa Via Láctea e nas galáxias próximas, a luz infravermelha é capaz de atravessar as nuvens de poeira interestelar e ajudar a revelar os segredos astrofísicos nelas ocultos, como formação de estrelas e sistemas planetários. Finalmente, o Webb poderá detectar a emissão infravermelha de estrelas, em geral, das próprias nuvens de poeira — todo objeto aquecido emite no infravermelho —, estejam elas ao redor das estrelas em formação ou vagando pelo espaço, e a emissão integrada de galáxias inteiras.

Mais detalhes em Telescópio Espacial James Webb.


Atualização: 26out21



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