Divagação científica: buracos relativistas

Domingos Soares

12 de abril de 2017

Resumo

Introduzo o conceito de “divagação científica”, que é a especulação científica ancorada nas extrapolações de teorias físicas e de conhecimentos experimentais estabelecidos. Distingo-a da atividade artístico-literária denominada “ficção científica” e apresento alguns exemplos populares de divagação científica.


1. Introdução

Ficção científica (FcC): o dicionário Aulete Digital registra na terceira acepção da palavra “ficção” o seguinte. “Ramo de criação artística, literária, cinematográfica, teatral, etc. baseada em elementos imaginários (ficção científica; ficção policial).” De modo geral, então, quando falamos de “ficção científica” estamos pensando numa criação artística e literária. Mas existe um outro tipo de discurso científico que denominarei “divagação científica” (DvC). (Atenção, não confundir com “divulgação científica”, que é outra história.) A DvC é a extrapolação do conhecimento científico estabelecido através da consideração de possibilidades futuras de avanços científicos teóricos, experimentais e observacionais.

A FcC é totalmente livre — a criação artística é livre, por definição; a DvC possui liberdade limitada, pois tem um pé nas leis conhecidas das ciências da natureza e outro na “especulação bem-educada”.

Um dos maiores expoentes da DvC é o físico estadunidense Kip Thorne. Ele foi aluno do grande John Archibald Wheeler (1911-2008), que foi o seu mentor tanto em física teórica quanto em DvC — que, a propósito, é um ramo da física teórica. A FcC bebe do manancial da DvC e a DvC bebe do manancial da FcC.

Kip Thorne protagonizou um recente episódio de FcC e DvC: o filme Interestelar. Não comentarei o filme, mas sim alguns aspectos da DvC nele presentes. Os interessados em comentários a respeito do filme podem assistir o próprio Kip Thorne discorrendo sobre ele numa curiosa palestra de 1 hora em The Science of Interstellar (para facilitar o entendimento do inglês, acionar as legendas no primeiro ícone à direita na barra de baixo do YouTube).

Kip Thorne é também o autor de um livro de divulgação científica intitulado Black Holes & Time Warps (BHTW, 1994), onde podemos encontrar a descrição das mais preciosas pérolas de sua lavra de DvC, muitas delas presentes em Interestelar. O meu propósito é comentar algumas destas pérolas, destacando-se os buracos de minhocas (BMs), as máquinas do tempo (MTs) e os buracos negros (BNs).

Nos exemplos que discutirei, a saber, os BMs, as MTs e os BNs, a plausibilidade das DvCs específicas de cada caso são frequentemente amparadas pela crença de que teremos no futuro uma teoria de Gravitação Quântica (GQ), que as vindicaria e justificaria as especulações feitas. Este tipo de crença — a do aparecimento de uma teoria mais completa no futuro — é uma característica marcante das DvCs em geral.

2. Pérolas da Divagação Científica

De acordo com BHTW (p. 485), os BMs foram descobertos matematicamente pelo físico austríaco Ludwig Flamm (1885-1964) como uma solução da equação de campo de Albert Einstein (1879-1955), em 1916, poucos meses depois de Einstein ter formulado a sua equação da Teoria da Relatividade Geral (TRG). Einstein e o físico estadunidense Nathan Rosen (1909-1995) os exploraram na década de 1930 e Wheeler e seu grupo (do qual fez parte Kip Thorne), na década de 1950. Os BMs são os mais populares candidatos a MTs em todas as DvCs modernas.

A possibilidade conceitual moderna de existência de BNs surgiu também em 1916, como consequência direta do trabalho do astrônomo e físico alemão Karl Schwarzschild (1873-1916). A sua solução da equação de campo da TRG apresentava uma singularidade, i.e., um resultado infinito para determinado valor das coordenadas espaciais. Qualquer significado físico associado a esta singularidade foi rejeitado por Einstein e pelo astrofísico inglês Arthur Eddington (1882-1944), as maiores autoridades em TRG nas décadas iniciais após a formulação da TRG (BHTW, p. 134). Somente na década de 1960 as pesquisas com os BNs, como os conhecemos hoje, começaram a ser realizadas, especialmente a partir de 1967, quando Wheeler cunhou o termo “buraco negro” (BHTW, p. 256).

Discorrerei um pouco sobre cada uma destas DvCs a seguir.

2.1. Buracos de Minhoca e Máquinas do Tempo

Os BMs são túneis através do hiperespaço (espaço hipotético onde o espaço-tempo real está embutido), que ligam uma região espaço-temporal do universo a outra. Eles funcionam como atalhos espaço-temporais. O seu nome vem da analogia com o buraco que um bicho de goiaba faz ao atravessá-la pelo seu interior. O seu percurso de um ponto da casca da goiaba a outro ponto da casca pode assim ser bem menor do que o percurso feito sobre a casca da goiaba. A figura 1 mostra exemplos destes dois caminhos.



Figura 1

O bicho de goiaba B pode ir do ponto 1 ao ponto 2 pelos dois caminhos mostrados. O “buraco de minhoca” por dentro da goiaba representa o caminho mais curto dos dois.


As viagens interestelares poderiam então ser possíveis, apesar das enormes distâncias até as estrelas mais próximas. A viagem poderia ser feita mais rapidamente por um atalho através do hiperespaço com o auxílio de um BM. Kip Thorne utiliza outra nomenclatura em sua palestra mencionada acima: ele chama o universo quadridimensional (3 coordenadas espaciais + 1 temporal) em que vivemos de Brana, que é uma abreviação da palavra “Membrana”. Então, a Brana contém as 4 dimensões de nosso universo. Fora da Brana está o hiperespaço, que ele chama de Volume, que é um espaço de mais dimensões onde a Brana está embutida. É importante salientar que o hiperespaço (o Volume) é um espaço hipotético, não existe, mas é útil para a compreensão dos fenômenos que ocorrem na Brana.

A figura 2 ilustra a situação descrita acima. A Brana quadridimensional é representada por uma superfície. O BM liga dois pontos da Brana por um atalho através do Volume. No exemplo da goiaba da figura 1, a casca da goiaba é a Brana e a sua polpa é o Volume interior e a parte de fora da goiaba o Volume exterior. O buraco do bicho pode ser considerado como uma alteração topológica — i.e., da forma — da casca, sendo, portanto, uma extensão da Brana que atravessa o Volume interior.



Figura 2

O viajante interestelar pode ir do Sol (S) à estrela E pelos dois caminhos mostrados. O “buraco de minhoca” por dentro do Volume (hiperespaço) representa o caminho mais curto dos dois. As regiões da Brana de entrada e saída do BM são chamadas “bocas” do BM.


A questão importante é que desde a descoberta dos BMs verificou-se que eles são instáveis. Depois de criados eles são rapidamente destruídos através do estrangulamento de suas paredes. E a rapidez do processo é tão grande que nem um raio de luz consegue percorrer o caminho de boca a boca. Aqui entra então a DvC. O estrangulamento do BM pode ser evitado se houver em seu interior um reservatório de “energia negativa”, a qual exerceria uma pressão contrária ao estrangulamento gravitacional. É possível? É, mas ainda não se descobriu a tal substância que possuiria esta energia negativa. Trata-se de substância semelhante à energia escura do Modelo Padrão da Cosmologia (o modelo do Estrondão Quente, cf. Soares 2016), a qual exerce a pressão cósmica que resiste à pressão gravitacional de desaceleração e torna a expansão do universo acelerada, a partir de épocas recentes. Tudo é possível, mas exige uma dose elevada de DvC, com referências frequentes à putativa teoria de GQ.

E as MTs? As MTs podem ser BMs (entre outras DvCs curiosas, das quais não tratarei aqui). Pois bem, devido ao fato de que os BMs conectam dois eventos espaço-temporais do universo, eles podem muito bem conectar dois pontos do espaço, dos quais um está no presente e outro no passado. Ou seja, podemos entrar por uma boca do BM no presente e sair pela outra boca no passado. Isto se pudéssemos evitar o estrangulamento do BM, o que uma civilização superavançada pode ser capaz de fazer. O problema é que além de limitações tecnológicas, pode haver um impedimento natural, de que falarei abaixo, pelas palavras de Kip Thorne.

2.2. Buracos Negros

O buraco negro é um objeto teórico singular que aparece em uma das soluções da equação de campo da TRG, qual seja, a solução de Schwarzschild (cf. seção 2 de Soares 2009). A solução de Schwarzschild fornece a estrutura do espaço-tempo no exterior de um corpo esférico qualquer sem rotação. O BN é uma singularidade desta solução. Em física teórica uma singularidade é algo que não existe, nem na natureza nem na concepção formal da teoria, em última análise, é a derrocada de uma teoria. No jargão da física, dizemos que uma solução “explode” quando encontra uma singularidade. Em geral, em uma singularidade a solução tende para um valor infinito. É o que acontece com a solução de Schwarzschild. Ela explode no chamado raio de Schwarzschild, que vale:


RS = 2GM/c2,


onde M é a massa do corpo, G é a constante de gravitação universal e c é a velocidade da luz no vácuo. Um BN é caracterizado pelo chamado horizonte de eventos — ou simplesmente horizonte — que é uma superfície esférica cujo raio é RS. Classicamente, i.e., fora dos domínios da GQ, o BN é um corpo de massa M que ocupa uma região esférica de raio RS, apesar da solução não ser definida em R = RS.

A figura 3 ilustra a singularidade denominada BN. O ponto de interrogação indica que para R ≤ RS a solução de Schwarzschild é desconhecida, ou mais precisamente, não existe.



Figura 3

A TRG nos mostra que o espaço — mais precisamente, o espaço-tempo — curva-se próximo a um corpo qualquer. É como se o espaço fosse um lençol de borracha e os corpos se “afundassem” nele. Acima vemos a curvatura do espaço em torno do Sol, de uma estrela anã branca, de uma estrela de nêutrons e de um buraco negro. O buraco negro faz um buraco “sem fundo” no espaço, ou dito de outra forma, um buraco cujo fundo é totalmente desconhecido.


O espaço em torno do buraco negro só é bem definido para R > RS, onde RS, o raio de Schwarzschild, está mostrado na figura. O ponto de interrogação chama a atenção para este fato. As representações mostradas acima são analogias bidimensionais de realidades espaciais tridimensionais. Tente imaginar estas últimas.

O raio de Schwarzschild pode ser escrito em termos da massa do Sol como RS = 3 (M/MSol) km. Ou seja, um BN com a massa M igual à massa do Sol terá RS = 3 km e o seu horizonte de eventos será a superfície esférica de 3 km de raio.

Rigorosamente, toda a pesquisa científica em torno de BNs pertence ao domínio da mais pura DvC. A propósito, ao contrário do que é frequentemente afirmado, a singularidade não está no interior do horizonte de eventos; a singularidade é o horizonte eventos, situado em R = RS. Para os interessados no assunto, o capítulo 3 de BHTW é a fina flor da DvC sobre buracos negros.

3. Fala Kip Thorne

Vamos agora à lavra de Kip Thorne referente às DvCs apresentadas na seção 2. Apresento primeiro trechos sobre BMs e MTs e em seguida relacionados aos BNs.

Podemos imaginar duas estratégias para construir um buraco de minhoca onde antes não havia nenhum: uma estratégia quântica; e uma estratégia clássica. A estratégia quântica depende das flutuações gravitacionais do vácuo, i.e., o análogo gravitacional das flutuações eletromagnéticas do vácuo (…)

Em 1955, John Wheeler, por meio da combinação das leis da mecânica quântica e das leis da relatividade geral de uma forma tentativa e grosseira, calculou que em uma região do tamanho do comprimento de Planck-Wheeler, 1,62×10−33 centímetro ou menor, as flutuações de vácuo são tão enormes que o espaço como o conhecemos “ferve” e apresenta-se como bolhas de uma espuma quântica — o mesmo tipo de espuma quântica que forma o cerne de uma singularidade do espaço-tempo (BHTW, p. 494).

Note que esta é a mesma espuma quântica que, acredita-se, resida no interior da singularidade de um buraco negro (cf. BHTW, p. 478).

Não entendemos suficientemente bem as leis de gravitação quântica para inferir, em 1993, se a construção quântica de buracos de minhocas é possível. Nós entendemos as leis da gravitação clássica (relatividade geral) suficientemente bem para saber que a construção clássica de buracos de minhoca é permitida somente se a maquinaria de construção, seja qual for, torça o tempo tão fortemente, em todos os sistemas de referência, que ela produza, pelo menos brevemente, uma máquina do tempo (BHTW, p. 498).
BHTW foi escrito em 1993, daí a menção do ano; a situação referente à GQ permanece a mesma hoje em dia. “Torcer o tempo” parece algo estranho, mas é bom lembrar que em TRG “tempo torcido” é um dos nomes de “gravitação”. O conteúdo de matéria-energia do universo e sua pressão torcem o tempo e o espaço, sendo esta a forma com que a TRG descreve os efeitos gravitacionais, os quais a teoria newtoniana descreve de outra forma.

As leis da relatividade geral predizem, inequivocamente, o fluxo do tempo nas duas bocas [do BM], e predizem, inequivocamente, que o os dois fluxos do tempo serão os mesmos quando comparados através do buraco de minhoca, mas serão diferentes quando comparados fora do buraco de minhoca. O tempo, neste sentido, conecta-se a si mesmo diferentemente através do buraco de minhoca do que através do Universo externo, quando as duas bocas estão movendo-se uma em relação à outra.

E esta diferença de conexão, eu então percebi, implica que a partir de um único buraco de minhoca, uma civilização infinitamente avançada pode fazer uma máquina de tempo (BHTW, 502).

A MT requer, portanto, uma civilização infinitamente avançada. A MT está também intimamente relacionada a uma “dobra do tempo” (Time Warp, o TW de BHTW), ou seja, a uma percepção diferente do fluxo do tempo a partir de referenciais diferentes.

O físico teórico inglês Stephen Hawking acredita que as MTs são impossíveis de existir na natureza. Na falta de uma teoria de GQ ele não consegue provar a sua crença — a sua DvC —, então ele propôs uma conjetura a respeito do tema. Vejamos a seguir nas palavras de Kip Thorne.

Hawking tem uma opinião firme a respeito das máquinas do tempo. Ele acha que a natureza as abomina, e incorporou aquela abominação numa conjetura, a conjetura da proteção da cronologia, a qual diz que as leis da física não permitem máquinas do tempo (BHTW, p. 521).
Se a conjetura puder ser provada um dia, mesmo uma civilização infinitamente avançada não poderá construir uma máquina do tempo. Talvez Hawking esteja certo e por isto até agora, ao que parece, não recebemos a visita de um habitante do futuro.

Kip Thorne está tão convencido da necessidade urgente de uma teoria de GQ que ele se equivoca quando fala dos anseios de Einstein por uma teoria física unificada. Leiamos:

Albert Einstein gastou a maioria de seus últimos vinte e cinco anos numa tentativa infrutífera de unificar as suas leis relativistas gerais da física com as leis do eletromagnetismo de Maxwell; ele não sabia que a mais importante unificação é com a mecânica quântica. Ele morreu em Princeton, Nova Jersey, em 1955 com a idade de setenta e seis anos (BHTW, p. 525).
Kip Thorne erra aqui. A unificação desejada é bem mais ampla e Einstein certamente sabia disso. Bem antes de 1955 já haviam trabalhos de unificação do eletromagnetismo e da mecânica quântica, que viriam a resultar na eletrodinâmica quântica. A unificação da eletrodinâmica quântica com a interação nuclear fraca estava em andamento e seria coroada com o prêmio Nobel de 1979 para os seus desenvolvedores, os quais criaram a “teoria da interação eletrofraca”. Havia ainda a interação nuclear forte, que Einstein não desconhecia. Em outras palavras, o projeto de unificação é bem mais amplo do que o desenhado por Thorne e atribuído a Einstein.

Sobre Karl Schwarzschild, cuja solução particular da equação de campo de Einstein levou à ideia de BN, Kip Thorne afirma:

O primeiro passo [após a apresentação inaugural da TRG em 1915; Soares 2014] foi dado por Karl Schwarzschild, um dos maiores astrofísicos do início do século vinte.
(…)
Quase que imediatamente, ele se dispôs a descobrir quais as predições que as novas leis de gravitação de Einstein poderiam fazer a respeito das estrelas. Já que seria muito complicado, matematicamente, analisar uma estrela que gira ou que não é esférica, Schwarzschild restringiu-se a estrelas que não giram de forma alguma e que são exatamente esféricas, e para facilitar os seus cálculos, ele procurou primeiro uma descrição matemática do exterior da estrela e adiou o seu interior para mais tarde.
(…)
O seu cálculo foi elegante e belo, e a geometria curva do espaço-tempo predita por ele, a geometria de Schwarzschild como ela logo passou a ser conhecida, destinou-se a ter um impacto enorme em nosso entendimento da gravidade e do Universo (BHTW, p. 124).
O BN representa, como mencionado anteriormente, uma singularidade da geometria de Schwarzschild, e foi durante muito tempo conhecido como “singularidade de Schwarzschild”. A singularidade recebeu outros nomes, até que o nome inventado por John Wheeler acabou prevalecendo. A solução de Schwarzschild representa a maior — senão, até o momento, a única — contribuição da TRG para a gravitação. Ela possui várias aplicações de real sucesso como, por exemplo, no cálculo da dinâmica de sistemas planetários (entre estes, o sistema solar), no cálculo da deflexão da luz por um corpo qualquer e no desenvolvimento das tecnologias de localização por satélite tipo GPS (Global Positioning System). O BN é uma DvC da solução de Schwarzschild. Ondas gravitacionais e outros fenômenos gravitacionais extremos estão fora da abrangência da solução de Schwarzschild, mas fazem parte das mais genuínas DvCs, alguns deles por requererem detectores extremamente sensíveis e especiais sendo, portanto, não observados, e outros por aguardarem “uma teoria completa de GQ”. A solução de Schwarzschild não aguarda por nada e possui aplicações práticas de enorme precisão experimental. O grande conceito científico de que goza a TRG vem exatamente da solução encontrada por Karl Schwarzschild em 1916 (cf. destacado em Soares 2014).

O próprio Einstein não gostou da singularidade de Schwarzschild:

“O resultado fundamental desta investigação,” Albert Einstein escreveu em uma nota técnica em 1939, “é um claro entendimento das razões pelas quais as ‘singularidades de Schwarzschild’ não existem na realidade física.” Com estas palavras, Einstein mostrou de forma clara e inequívoca a rejeição de seu próprio legado intelectual: os buracos negros que as suas leis da gravidade da relatividade geral pareciam estar predizendo (BHTW, p. 121).
A citação de Einstein acima está no penúltimo parágrafo das 15 páginas do artigo de 1939 e o último contém as seguintes palavras (os sublinhados são meus): “This investigation arose out of discussions the author conducted with Professor H. P. Robertson and with Drs. V. Bargmann and P. Bergmann on the mathematical and physical significance of the Schwarzschild singularity. The problem quite naturally leads to the question, answered by this paper in the negative, as to whether physical models are capable of exhibiting such a singularity.”

Ao contrário do que muitas vezes se propala, BNs ainda são peças de DvC. Rigorosamente, eles não existem, mas representam limites desconhecidos da física conhecida. Kip Thorne confirma este julgamento em muitos locais de seu BHTW.

4. Considerações finais

A menção recorrente da necessidade de uma teoria de Gravitação Quântica evidencia a precariedade factual das DvCs mencionadas aqui. Elas são exemplos claros do conceito de DvC, i.e., a ficção acoplada à especulação educada, esta frequentemente ancorada na possibilidade de existência de uma GQ no futuro.

Neste pequeno inventário de buracos relativistas certamente alguém deve ter sentido falta dos buracos brancos. Estes podem ser entendidos como buracos negros “invertidos no tempo”, ou seja, neles os processos físicos ocorrem de forma invertida daquela em que ocorrem nos BNs. Por exemplo, a matéria e a radiação emergem de um buraco branco com altas energias. Esta DvC foi popular na década de 1970, segundo o cosmólogo inglês Edward Harrison (1919-2007), e a ideia parece não ser mais sustentável, como ele afirma de passagem no capítulo sobre BNs de seu Cosmology, The Science of the Universe (2000). O buraco branco foi uma DvC que não pegou. A propósito, não há qualquer menção de buracos brancos em BHTW.

Os buracos relativistas constituem, metaforicamente, verdadeiros “buracos” na estrutura formal da TRG. Segundo muitos, Kip Thorne entre eles, tais buracos só serão tapados quando dispusermos de uma reparadora teoria de GQ.

Kip Thorne, com seu BHTW, foi a nossa referência principal na discussão dos buracos relativistas. Se a qualidade de BHTW como obra de divulgação científica pode ser questionada, certamente temos ali um dos melhores tratados de divagação científica.



Atualização: 04ago17


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